Diário do Aço - MG 28/10/2024
A Usiminas completa 62 anos de instalação neste sábado (26). Companhia produz anualmente aproximadamente quatro milhões de toneladas de aço. O aço produzido em Ipatinga atende, principalmente, o mercado automotivo, a construção civil, a indústria de eletrodomésticos, óleo e gás, naval e energia.
A empresa, que possui unidades siderúrgicas em Ipatinga e em Cubatão (SP), também faz a extração de minério de ferro por meio da Mineração Usiminas e está preparada para atender às demandas de diversos segmentos do mercado, em variadas quantidades e formatos, por meio da Solução Usiminas. No entanto, a empresa enfrenta os desafios de um mercado extremamente competitivo e com exigências ambientais cada vez mais rigorosas.
Há exatamente um ano, a empresa passava a ser presidia por Marcelo Chara. Na época, o executivo era presidente da Ternium Brasil, mas antes, tinha sido vice-presidente Industrial da Usiminas entre 2012 e 2014. Desta forma, o Executivo retornou a Ipatinga há um ano com a missão dar sequência às operações da siderúrgica. Em entrevista ao Diário do Aço, Chara faz um balanço do seu primeiro ano à frente da empresa, explica mudanças tecnológicas e fala sobre o futuro da companhia.
Qual o balanço pode ser feito de um ano da gestão do senhor à frente da Usiminas?
Neste primeiro ano de gestão, enfrentamos diversos desafios operacionais e ambientais, como a reforma do alto-forno 3, um projeto complexo e essencial para a competitividade e futuro da Usiminas.
Nosso foco é estar cada vez mais próximos dos nossos clientes, buscando maior eficiência operacional e mirando nos mercados de maior valor agregado, sempre com a segurança e o meio ambiente como prioridades absolutas, integrando as comunidades em todas as regiões onde atuamos.
Quais os investimentos na área ambiental podem ser destacados?
Nos últimos anos, temos realizado uma série de investimentos e implementado diversas ações importantes na área ambiental. Entre eles, destaco a paralisação de uma de nossas coquerias – uma medida tomada com foco prioritariamente ambiental, a instalação de canhões de névoa nos pátios de matéria-prima, a implantação da Central de Monitoramento Ambiental e da Rede Automática de Monitoramento de Particulados (Ramp). Além disso, colocamos medidores de vazão nas chaminés e fizemos reformas em grandes equipamentos, como sistemas de despoeiramento, filtros de manga e precipitadores eletrostáticos. No entanto, reconhecemos que ainda há um caminho a percorrer, porque a percepção da comunidade ainda é crítica.
Estamos focados na melhoria da gestão dos nossos processos, tendo a parte ambiental como uma variável básica nas decisões operacionais diariamente, além de analisar novos investimentos. Esse é o nosso compromisso com a comunidade, ter excelência industrial cuidando do meio ambiente. Estamos trabalhando para sermos bons vizinhos e conviver em harmonia com a comunidade.
E associado a isso, como a Usiminas tem tratado as inovações tecnológicas em sua planta?
Na Usiminas, a inovação tecnológica é uma prioridade em todas as nossas operações. Temos uma equipe focada exclusivamente em identificar e implementar soluções que otimizem nossos processos industriais e, principalmente, contribuam para a redução dos impactos ambientais.
Um exemplo é a tecnologia que utilizamos para a detecção automática de emissões. Por meio de um sistema avançado de inteligência artificial, nossa Central de Monitoramento Ambiental analisa imagens captadas pelas câmeras da planta, interpretando, em tempo real, fatores como duração, opacidade e intensidade das emissões. Isso permite gerar alertas precisos, imediatos e planos de ação para a melhoria contínua.
O sistema também tem a capacidade de operar 24 horas por dia, diferentemente de outras soluções que dependem de luz natural, o que aumenta ainda mais a eficiência do nosso monitoramento.
Temos vários outros projetos na Usiminas envolvendo robôs, inteligência artificial, automatização, enfim, tudo que possa contribuir para eficiência dos nossos processos, principalmente em segurança e meio ambiente.
Como o senhor vê o atual cenário com as importações do aço chinês no mercado interno? O setor siderúrgico foi ao governo pedir providências em relação às importações, pleito que foi atendido em abril de 2024, com a sobretaxa de 25% sobre o excedente. Isso gerou resultado práticos para a Usiminas?
Reconhecemos o esforço do governo em tentar conter a entrada de aço chinês no Brasil, mas, até o momento, as medidas aplicadas, como o sistema de cota tarifa, ainda não trouxeram resultados efetivos. Em mais de quatro meses de implementação, não observamos impactos significativos, pelo contrário, as importações seguem em ritmo elevado, com média mensal superior a 2023, segundo ano com maior volume de importação da história. Sabemos que o diálogo e o trabalho conjunto com o governo são fundamentais para ajustar as políticas e criar mecanismos que evitem a entrada de aço subsidiado, que distorce o mercado local. Além da sobretaxa, também está em andamento uma investigação antidumping sobre os laminados a frio e revestidos, que foi protocolada pela Usiminas. Contudo, acreditamos que é necessário encontrar soluções de curto prazo que sejam mais eficazes para conter essa invasão de aço chinês no mercado interno, que impacta diretamente nos empregos qualificados dos brasileiros.
A Usiminas chegou aos 62 anos. O que pode ser pontuado como os próximos desafios a serem enfrentados pela empresa?
Nosso maior desafio está em Ipatinga e Cubatão, onde a proximidade com a comunidade exige um compromisso ainda maior com práticas seguras e sustentáveis. Para garantir a longevidade da Usiminas na indústria, precisamos ser referência em segurança, gestão ambiental, operacional e na geração de produtos de alto valor agregado. E isso só se alcança com uma liderança presente, conhecimento técnico, foco, capacitação, desenvolvimento das pessoas e inovação.
Muito se fala na produção com redução de CO2, qual o caminho a empresa deverá adotar daqui para frente?
Lançamos um robusto Plano de Descarbonização como parte da nossa agenda ESG (Ambiental, Social e Governança), com redução de 15%, até 2030, na intensidade de emissões por tonelada de aço bruto produzido, considerando 2019 como ano base.
Por fim, sobre investimentos na educação e geração de oportunidade para os jovens, como esse assunto é tratado pela Usiminas?
Acreditamos firmemente que a educação é uma das principais ferramentas para o desenvolvimento das pessoas e da sociedade. Neste ano, anunciamos um investimento de R$ 1,8 milhão, com foco em melhorar as condições do ambiente escolar e reconhecer o bom desempenho dos estudantes. Vamos reformar uma escola pública em Ipatinga, com o apoio de voluntários da Usiminas, além de trazer o programa Bolsas de Excelência, que premiará 50 estudantes do ensino médio de escolas públicas, em reconhecimento ao mérito acadêmico em Ipatinga e Cubatão.
Essas ações se somam aos investimentos contínuos que fazemos em áreas como cultura e esporte, além da disponibilização de mais de 100 imóveis cedidos em comodato para instituições sociais no Vale do Aço. Esses projetos refletem o nosso compromisso em apoiar o desenvolvimento humano e social, demonstrando o papel ativo que a indústria deve desempenhar na transformação das comunidades onde está inserida.
Valor - SP 28/10/2024
Venda de aço da siderúrgica brasileira chegou a 1,12 milhão de toneladas entre julho e setembro, crescimento de 10% na comparação anual
A Usiminas teve produção de 873 mil toneladas de aço no terceiro trimestre de 2024, alta de 148% na comparação anual, o maior volume desde o terceiro trimestre de 2021, refletindo a continuidade na melhoria operacional do alto-forno 3 em Ipatinga (MG).
A venda de aço da siderúrgica brasileira chegou a 1,12 milhão de toneladas entre julho e setembro, crescimento de 10% na comparação anual. O melhor desempenho no mercado interno compensou queda de 37% nas exportações.
A empresa destaca que o custo por tonelada na siderurgia foi de R$ 5.164 no terceiro trimestre, contra R$ 5.719 há um ano, com melhor desempenho dos alto fornos, em especial sobre consumo de combustíveis e gastos com insumos.
Na sua unidade de mineração, a Usiminas teve produção de 2,18 milhões de toneladas de minério de ferro, queda de 9% no ano. Já as vendas somaram a 2,28 milhões de toneladas, redução de 4% no mesmo período.
A empresa destaca que o menor preço médio do minério vendido, caindo de US$ 114 a tonelada para US$ 99,7 a tonelada, além de penalidade sobre diferenciais de qualidade da commodity, afetou seu faturamento na unidade.
IstoÉ Dinheiro - SP 28/10/2024
A Usiminas divulgou nesta sexta-feira uma reversão de resultado negativo obtido no terceiro trimestre do ano passado com um lucro líquido de 185 milhões de reais e desempenho operacional que ficou acima do esperado pelo mercado.
A companhia apurou lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) de 426 milhões de reais em termos ajustados entre julho e setembro, um salto de 72% ante o desempenho do segundo trimestre e revertendo desempenho negativo de 20 milhões sofrido no ano passado.
Analistas, em média, esperavam Ebitda de 370 milhões de reais para a Usiminas no terceiro trimestre, sobre lucro líquido de 11 milhões, segundo dados da Lseg.
A produtora de aços planos que tem a Ternium como principal acionista divulgou ainda projeção de investimento de 1,1 bilhão de reais neste ano, um corte ante a estimativa divulgada em fevereiro, de dispêndios 1,7 bilhão a 1,9 bilhão de reais. A empresa não citou motivos para a redução no fato relevante divulgado ao mercado.
O desempenho da Usiminas no terceiro trimestre foi impulsionado em parte pela reativação do alto-forno 3 da companhia em Ipatinga, que passou por uma reforma geral bilionária e teve reativação gradual mais cedo neste ano.
Executivos da companhia vinham prometendo nos últimos trimestres que a empresa teria ganhos de produtividade e eficiência conforme os trabalhos de reativação do equipamento fossem sendo concluídos.
No terceiro trimestre, o custo do produto vendido (CPV) por tonelada na unidade de siderurgia foi de 5.164 reais, queda de 3,1% ante o período imediatamente anterior e redução de quase 10% ante o registrado pela Usiminas no balanço de um ano antes.
A Usiminas vendeu no trimestre passado 10% mais aço que o comercializado um ano antes, somando 1,13 milhão de toneladas, cifra que foi apoiada pelo o que a companhia afirmou ser o maior volume de produção do alto-forno 3 de Ipatinga desde 2010.
A empresa terminou o trimestre com uma relação dívida líquida sobre Ebitda de 0,38 vez, acima da 0,21 vez de um ano antes, mas abaixo do múltiplo de 0,79 dos três meses encerrados em junho deste ano.
IstoÉ Dinheiro - SP 28/10/2024
O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, destacou nesta sexta-feira, 25, que o Brasil é o único país com aumentos de juros precificados na curva. Durante palestra em Washington, o banqueiro central observou que muitos países estão na direção contrária, com o mercado antecipando afrouxamento da política monetária.
Ele ponderou que o comportamento dos juros no mundo vai depender muito do que será feito nos Estados Unidos, onde o Federal Reserve também começou a reduzir suas taxas. Em evento com investidores promovido pelo Itaú em paralelo às reuniões anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) na capital dos Estados Unidos, Campos Neto disse haver uma correlação grande na precificação de juros entre mercados desenvolvidos e os Estados Unidos.
Conforme o presidente do BC, o enfraquecimento do mercado de trabalho nos Estados Unidos ainda é muito marginal. Em paralelo, ele reafirmou que a transição verde, embora seja questão muito relevante, representa um processo custoso, colocando pressão na inflação global.
Veja - SP 28/10/2024
A China, país que nas últimas décadas nos acostumamos a ver como fábrica do mundo e grande consumidor de commodities, está caminhando para o seu novo normal na economia. No lugar das taxas de crescimento de dois dígitos de alguns anos atrás (veja o gráfico), passará a ter incrementos mais modestos, possivelmente na casa dos 3% ou 4% ao ano — ainda assim superiores à média de muitas nações. Há dez anos ou mais, já estava claro que esse momento chegaria. Nenhum economista pensou que seria fácil, seja para a China, seja para o mundo. Perdura, porém, a esperança que se deposita no país como motor do PIB global, como demonstra o tom de decepção da maioria das análises sobre os efeitos do pacote de estímulo econômico divulgado em fatias pelo governo chinês desde setembro. Do ponto de vista de Pequim, o desafio é manobrar para um pouso suave, de forma a garantir que o país continue se desenvolvendo em níveis sustentáveis, aproximando-se lentamente do topo dos países com renda mais alta, depois de ter tirado a maioria da população da pobreza.
O governo chinês havia definido uma meta de crescimento de 5% do PIB para este ano, mas os indicadores dos últimos meses não vêm confirmando essa projeção. A produção industrial desacelerou, as exportações enfrentam resistências na Europa e nos Estados Unidos por razões comerciais e políticas, os consumidores chineses relutam em abrir suas carteiras e os investimentos no país perderam força. O resultado é baixo crescimento e inflação próxima de zero na China. O índice de preços ao produtor recuou 2,8% no acumulado de doze meses até setembro — só não há deflação generalizada, ainda, porque os preços de alguns alimentos registraram alta. O problema da deflação é que ela cria um ciclo vicioso em que os consumidores adiam as compras à espera de que os preços caiam, os estoques nas empresas ficam abarrotados, a produção declina, investimentos são suspensos e empregos são ceifados, o que reduz ainda mais o consumo. Ou seja, cria-se recessão.
O governo reagiu a esse cenário com a divulgação do maior pacote de incentivo ao crescimento desde a pandemia de covid-19. Cortou a taxa de juros, liberou mais recursos para crédito bancário, criou novos incentivos para a compra de imóveis e para a renegociação de hipotecas, acenou com alívio fiscal para governos locais e facilitou as operações de recompra de ações, dando impulso às bolsas de valores — que encerraram a semana seguinte ao primeiro anúncio de estímulo com a maior alta de negociações em dezesseis anos. O ministro das Finanças, Lan Foan, afirmou depois que o governo estava disposto a aumentar bastante a liquidez na economia, mas os recursos injetados nas primeiras fases do pacote, da ordem de 30 bilhões de dólares, ficaram longe dos mais de 280 bilhões de dólares esperados por investidores e analistas.
Mais do que o tamanho do estímulo, a grande diferença se notará no formato da intervenção estatal. De pouco adianta aumentar a oferta de crédito, por exemplo, se as empresas e os cidadãos não estiverem confiantes para investir e comprar. “A China está, já há alguns anos, tentando mudar o seu modelo de crescimento baseado em exportação para um modelo mais amparado no consumo interno”, diz Marcus Vinícius de Freitas, professor visitante da Universidade de Relações Exteriores da China, em Pequim. A dificuldade de trilhar esse caminho reside principalmente em um traço cultural. Tradicionalmente, os chineses aceitam gastar em educação para os filhos e em imóveis, mas de resto são poupadores inveterados. Eles guardam dinheiro, por exemplo, para emergências médicas e para ter uma aposentadoria mais tranquila.
Essa tendência se intensifica em cenários de incerteza com a economia e, portanto, com os empregos. Em um primeiro momento, as medidas de estímulo anunciadas pelo governo turbinaram o comércio eletrônico e encorajaram os chineses a viajar mais no feriado nacional prolongado de início de outubro. Mas a população precisa ser incentivada a consumir mais no médio e no longo prazos para que o aquecimento econômico não seja apenas momentâneo.
As famílias chinesas já tiveram uma experiência ruim nesse sentido em um passado recente, quando se endividaram para comprar residências durante um boom imobiliário incentivado pelo governo, apenas para ver os preços no setor caírem mais à frente, quando as autoridades resolveram colocar um freio no mercado para evitar o estouro da bolha. Entre outros efeitos, isso levou a uma queda nos investimentos em construção civil, o que contribuiu para a desaceleração econômica e para o endividamento dos governos locais, que até então baseavam seus gastos em uma arrecadação sustentada em venda de terrenos para os empreendimentos. Outro fator que derrubou os investimentos em construção é o esgotamento de projetos de infraestrutura: a maior parte daquilo que o país precisava já foi colocada de pé nos últimos anos, quando a China se tornou um imenso canteiro de obras.
Há mais um desafio doméstico para o crescimento chinês no longo prazo, de natureza demográfica. O país tem, atualmente, um estoque significativo de jovens desempregados que podem ser absorvidos no mercado de trabalho, mas o envelhecimento da população preocupa. Nos próximos dez anos, 300 milhões de chineses vão se aposentar. Até lá, a proporção de cidadãos com mais de 60 anos vai ultrapassar a dos Estados Unidos. O Estado chinês se verá confrontado com as necessidades de melhorar o seu sistema previdenciário e de garantir a mão de obra para o futuro. Esse fenômeno foi agravado pela política de filho único que vigorou durante décadas na China. Atualmente, o governo do presidente Xi Jinping pensa em maneiras de fazer o oposto. Uma das medidas propostas para os pacotes de estímulo ao consumo neste ano é justamente a de fornecer mais auxílio em dinheiro para famílias com mais de um filho.
Uma alternativa de caminho a seguir para dar sustentação ao crescimento econômico é a da exportação de serviços e produtos de maior valor agregado, com inovação Made in China. Esforços nesse sentido já estão sendo feitos, em grande medida com sucesso, como demonstra a inundação de carros elétricos e de equipamentos para fontes renováveis de energia mundo afora — a preços tão competitivos que a China, de certo modo, tem exportado deflação. Simultaneamente, no entanto, as barreiras aos produtos e serviços chineses em muitos países também aumentou, seja com o argumento de proteger empresas e empregos locais, seja por razões estratégicas. “Em 2011, quando participei de uma reunião ao lado do então presidente Hu Jintao, em Pequim, escutei dele, pela primeira vez, que era preciso rebalancear a economia chinesa e direcioná-la para um novo padrão de crescimento”, diz Otaviano Canuto, ex-vice-presidente do Banco Mundial e membro sênior do Policy Center for the New South. “De fato, as altas taxas de investimento em proporção ao PIB não eram compatíveis com o baixo nível de consumo doméstico, e a equação só fechava com saldos comerciais gigantescos.”
A encruzilhada da economia chinesa, portanto, não oferece saídas fáceis. Fomentar o crescimento econômico via investimentos sem uma demanda interna ou externa condizente apenas eleva a capacidade ociosa, que já é alta em muitos setores produtivos. Adotar medidas para colocar lenha no consumo doméstico esbarra no instinto poupador das famílias chinesas. Apostar todas as fichas na inovação tecnológica para exportação faz crescer, na outra ponta, a resistência de muitos países preocupados com a concorrência comercial e com a ascensão geopolítica da China. Além disso, o crescimento via exportação tem uma dose de instabilidade, pois depende das variações da conjuntura internacional — que atualmente não é das mais promissoras.
Muitos economistas defendem que um caminho para incentivar a demanda interna de forma duradoura é reforçar o sistema de proteção social e de serviços públicos, para que os chineses não sintam a necessidade de poupar para o caso de ficarem desempregados ou de precisarem ser atendidos em um bom hospital, por exemplo. Xi Jinping, no entanto, já explicitou no passado que abomina o assistencialismo, sob a máxima de que não se deve dar “comida grátis aos preguiçosos”.
A decisão do governo de soltar medidas de estímulo ao aquecimento da economia de forma gradual pode ser uma maneira de testar e modular seus efeitos imediatos, mas fazer a tão antecipada mudança no modelo de crescimento chinês, obtendo um pouso suave nas taxas do PIB, exige reformas mais robustas, que resolvam o desafio estrutural da demanda frente à grande capacidade produtiva do país. Do contrário, a cada fim de ciclo de estímulos o gigante terá nova desaceleração econômica.
CNN Brasil - SP 28/10/2024
A Embaixada da China no Brasil definiu como irresponsável o comentário da chefe de Comércio dos Estados Unidos, Katherine Tai, de que o governo brasileiro deveria pesar os riscos de aderir à Nova Rota da Seda, projeto internacional de investimentos chineses.
Em nota assinada por Li Qi, porta-voz da embaixada chinesa, Pequim avaliou que o ato da representante americana “carece de respeito ao Brasil, um país soberano, e despreza o fato de que a cooperação sino-brasileira é igualitária e mutuamente benéfica.”
Autoridades brasileiras e chinesas trabalham em um acordo sobre o projeto, que pode ser divulgado no mês que vem, quando o líder chinês, Xi Jinping, visitará o Brasil e deve ter uma reunião bilateral, em Brasília, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Na nota, Pequim ressaltou que a iniciativa da Nova Rota da Seda “é uma importante medida para promover uma abertura de alto nível da China ao mundo e ao mesmo tempo, uma plataforma internacional para levar adiante um desenvolvimento inclusivo e universalmente benéfico da globalização econômica. A iniciativa está aberta para países com as mesmas aspirações, em busca duma cooperação de consulta extensiva, contribuição conjunta e resultados compartilhados.”
Fala americana
Na última quarta-feira (23), a representante americana disse, em um evento organizado pela Bloomberg, em São Paulo, que o Brasil deveria ter cautela com uma possível adesão à iniciativa chinesa.
“O Brasil deve se perguntar qual é o caminho que leva a mais resiliência não só da economia brasileira, mas da economia global”, afirmou Katherine durante um debate sobre a relação EUA e China.
Sinalização
Em agosto, o presidente Lula deu sinal de que o Brasil pode aderir ao megaprojeto de infraestrutura da China.
“Os chineses querem discutir conosco a ‘Rota da Seda’. Nós vamos discutir a ‘Rota da Seda’”, disse Lula sobre a iniciativa, que sofre crescente objeção de parceiros ocidentais do Brasil, como Estados Unidos e União Europeia.
“Nós não vamos fechar os olhos, não. Nós vamos dizer: O que é que tem para nós? O que eu tenho com isso? O que eu ganho? Porque essa é a discussão”.
“Não pense que quando falo da China quero brigar com os EUA, pelo contrário. Quero os Estados Unidos do nosso lado tanto quanto quero a China. Eu quero saber onde é que nós entramos, qual o lugar eu vou entrar, com quem eu vou dançar? O Brasil só será respeitado se tiver projeto”, completou Lula.
O Estado de S.Paulo - SP 28/10/2024
Em condições normais, as economias funcionam em dominância monetária, ou seja, os bancos centrais possuem autonomia para estabelecer a taxa básica de juro compatível com a convergência da inflação à meta e com o PIB efetivo ao potencial. Mas, dado que a taxa de juros afeta o endividamento público, cabe ao governo (Executivo e Congresso) praticar a política fiscal que mantenha a sustentabilidade da dívida pública.
Quando o governo administra o Orçamento público sem levar em conta o custo de rolagem de seus passivos, ou seja, gera uma trajetória de crescimento contínuo da relação dívida/PIB, os agentes econômicos podem perder a confiança quanto à sustentabilidade da dívida, levando a economia para a dominância fiscal (DF).
Em DF, a política monetária perde sua eficácia, chegando mesmo a funcionar de forma invertida, ou seja, aumentos da taxa de juros, ao promover piora fiscal, podem elevar a inflação em vez de reduzi-la.
Não há precisão na definição de dominância fiscal, mas a estrutura teórica mais elaborada me parece ser a Teoria Fiscal do Nível de Preços (TFNP), formalizada detalhadamente por John Cochrane. Para ele, os preços se ajustam para que o valor real da dívida do governo seja igual ao valor presente dos resultados primários esperados, de forma a garantir a sustentabilidade da dívida. Ou seja, os agentes econômicos, convencidos desse desequilíbrio, ajustam suas expectativas para mais inflação, e isso se torna uma profecia autorrealizável.
É muito difícil constatar com segurança se o País está ou não em dominância fiscal e sob a prevalência do equilíbrio preconizado pela TFNP. Mas o estado atual da economia brasileira sugere que essa situação pode estar próxima, se é que já não foi atingida. Observe-se que não é necessário que o governo esteja realizando grandes déficits fiscais para se instalar a DF.
Basta que os agentes econômicos acreditem que o Orçamento público não será executado de forma a garantir a sustentabilidade intertemporal da dívida pública. E parece ser essa a situação brasileira atual. Não há o registro de grandes déficits primários, mas os sinais de descontrole futuro, inclusive por parte do Congresso, são evidentes.
Pelo cenário da MCM Consultores, a relação dívida bruta/PIB saltará de 78,4%, em 2024, para 82,5%, em 2025. E esse aumento se deve principalmente aos juros reais, dado que o efeito do déficit primário estimado será inteiramente compensado pelo crescimento real do PIB. Ou seja, dada a previsão de insustentabilidade da dívida, o mercado projeta mais juros, que acabam aumentando o buraco fiscal e estimulando a inflação.
A única maneira de sair dessa armadilha é o governo propor medidas que conduzam a significativa melhora do cenário fiscal, mesmo que tais medidas só entrem em vigor após o atual mandato presidencial. É preciso sustar, com urgência, a crise de confiança.
O Estado de S.Paulo - SP 28/10/2024
Mercados diversos têm se mostrado capazes de administrar bem as suas economias num contexto global polarizado, disse o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ilan Goldfajn, neste sábado, 26, em Washington (EUA), durante apresentação no Seminário Anual de Bancos Internacionais.
Ele ressaltou que o fato de o Banco Central do Brasil ter adotado uma postura divergente do Federal Reserve (Fed) quanto aos juros demonstra sua independência operacional.
No mês passado, o Fed reduziu em 0,50 ponto porcentual a taxa básica de juros, que passou a variar entre 4,75% e 5% ao ano. Foi o primeiro corte em quatro anos. Também em setembro, o Banco Central brasileiro elevou em 0,25 ponto porcentual a taxa básica de juros. A Selic foi de 10,50% para 10,75% ao ano. Foi o primeiro aumento desde maio de 2022.
“Essa eficácia é notável em várias regiões, incluindo a América Latina, onde a atuação dos bancos centrais, especialmente no timing de elevação das taxas de juros, foi benéfica”, afirmou Goldfajn, citando que o Banco Central do Brasil tem adotando uma postura divergente do Federal Reserve, o que reforça a percepção de sua independência operacional.
“Essa independência, contudo, não implica uma desconsideração dos eventos globais, dada a sua relevância para a capacidade de ação dos bancos centrais”, ponderou.
Na avaliação do presidente do BID, o papel dos bancos centrais, que também atuam como reguladores, é crucial para a criação de estabilidade, essencial para o crescimento econômico, o manejo da dívida e o enfrentamento de grandes desafios.
“A importância dessa estabilidade não pode ser subestimada, abrangendo também a inclusão financeira, a modernização dos sistemas de pagamento e a integração das moedas digitais. Há um vasto campo de atuação para os bancos centrais que pode ser explorado”, disse ele.
Ele avaliou ainda que a polarização política crescente e as tensões que se manifestam globalmente vem prenunciando transformações futuras. Para ele, essa realidade se reflete globalmente, tornando mais evidente a diminuição dos espaços dedicados ao multilateralismo. “Apesar disso, sabe-se que há diálogo entre os bancos centrais, o que sugere uma busca por soluções conjuntas em meio a desafios compartilhados.”
Crise climática
O presidente do BID também abordou a crise climática, tema transversal e presente em todas as discussões. Para Ilan, há um grande potencial transformador do Brasil em questões globais, especialmente no que se refere às mudanças climáticas e a inovação tecnológica.
“As mudanças climáticas têm sido um fator que realmente tem mudado o contexto em que estamos trabalhando. Outros países estão enfrentando cada vez mais o custo da mudança climática e isso realmente está mudando a maneira como países lidam com as suas economias”, afirmou. Ele prevê que esse cenário pode beneficiar alguns países com abundância de recursos naturais, como o Brasil.
Neste contexto, ele avalia que a América Latina e o Caribe estão posicionados para desempenhar um papel fundamental em várias questões globais, particularmente na luta contra a mudança climática.
“A região tem o potencial de oferecer soluções inovadoras e sustentáveis, transformando o desafio climático em uma oportunidade de crescimento econômico e criação de empregos”, afirmou, destacando que, em vez de encarar a transição ecológica como um custo, os países deveriam vê-la como um investimento no futuro.
“A integração regional e a colaboração internacional são essenciais para aproveitar essas oportunidades. Por exemplo, a cooperação entre a América Latina e a Alemanha no desenvolvimento de hidrogênio verde e a transformação energética no Brasil são indicativos do potencial da região em contribuir para uma economia global mais sustentável”, afirmou o presidente do BID.
Além disso, ele avaliou que a América Latina pode desempenhar um papel vital na reconfiguração das cadeias de suprimentos globais, como demonstrado por estudos sobre suprimentos médicos e de infraestrutura.
Infomoney - SP 28/10/2024
O Índice de Preços ao Consumidor (IPC), que mede a inflação na cidade de São Paulo, subiu 0,62% na terceira quadrissemana de outubro, ganhando força em relação à alta de 0,52% verificada na segunda quadrissemana deste mês, segundo dados publicados pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) nesta sexta-feira (25).
Na terceira leitura de outubro, cinco dos sete componentes do IPC-Fipe avançaram em ritmo mais forte: Habitação (de 0,44% na segunda quadrissemana para 0,63% na terceira quadrissemana), Alimentação (de 1,00% a 1,05%), Transportes (de 0,18% a 0,28%), Despesas Pessoais (de 0,36% a 0,49%) e Saúde (de 0,59% a 0,73%).
Por outro lado, desaceleraram de uma quadrissemana para a outra as categorias Vestuário (de 0,31% a 0,22%) e Educação (de 0,07% a 0,03%).
CNN Brasil - SP 28/10/2024
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta sexta-feira (25) que as expectativas de inflação atuais estão piorando.
“Esta semana tivemos um dado, o IPCA-15, no qual o núcleo foi acima do esperado, não muito, mas marginalmente pior. O número foi marginalmente pior também”, comentou Campos Neto durante evento promovido pelo Itaú BBA, em Washington.
Na última quinta-feira (24), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 acelerou para 0,54% em outubro, um pouco acima da expectativa de 0,50% em pesquisa da Reuters, depois de subir 0,13% em setembro.
Por outro lado, Campos Neto também destacou o fato de na tarde desta sexta-feira a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ter anunciado que a bandeira tarifária de novembro será amarela, e não mais vermelha patamar 2, como em outubro. A mudança ocorreu, conforme a agência, em razão de uma melhora das condições de geração de energia no país, o que implicará em um corte na cobrança adicional na conta de luz para o próximo mês.
“Tivemos uma boa notícia, a bandeira amarela… muitos estão recalculando a inflação para novembro”, afirmou Campos Neto.
Durante sua apresentação, Campos Neto também avaliou que o mercado está mais “cético” em relação ao quadro fiscal, o que tem afetado os prêmios de risco no Brasil. Segundo ele, será preciso algum tipo de “choque” para reverter este cenário.
A avaliação de Campos Neto surge na esteira de elevações dos prêmios de risco na curva a termo brasileira nos últimos dias, com os agentes à espera de medidas de contenção de gastos. A promessa de autoridades do governo Lula é de que as medidas serão anunciadas após o segundo turno das eleições municipais.
Em sua fala, Campos Neto reforçou ainda a ideia de que o BC buscará atingir o centro da meta contínua de inflação, de 3%. “Vamos fazer o trabalho”, disse.
O Estado de S.Paulo - SP 28/10/2024
Economistas heterodoxos voltaram a pedir a elevação da meta de inflação. Não é novidade: periodicamente a proposta reaparece e, a cada reaparição, continua errada.
O argumento é o seguinte. Há resquícios de indexação na economia, ou seja, parcela dos preços ainda responde à inflação passada. Assim, para atingirmos a meta, a inflação dos não indexados teria de ficar abaixo dela, requerendo juros mais altos e crescimento menor. Com a meta mais alta, não seria necessário derrubar tanto a inflação dos não indexados, aliviando a pressão sobre a política monetária e permitindo crescimento mais elevado (de onde viria, dado que economia está em pleno-emprego, não se sabe).
O pressuposto implícito, contudo, é que a inflação esperada não se alteraria, o que dificilmente seria verdade.
Quando o BC segue as regras do regime de metas na presença de indexação, a inflação esperada será sempre a média ponderada da inflação passada e da meta para a inflação. Por exemplo, se a inflação passada foi 4% e a meta 3%, a expectativa seria, para simplificar, 3,5% (peso 50% para cada componente).
Dado que expectativas balizam o aumento de salários e preços, a inflação propriamente dita ficaria ao redor de 3,5%. No ano seguinte, a inflação esperada cairia para 3,25%, depois para 3,125% e assim por diante.
Se, porém, subirem a meta para 4%, a expectativa se ajustará à nova informação. Em nosso exemplo simples, pularia de 3,5% para 4%, atraindo consigo a inflação, já que tanto trabalhadores como empresas tenderiam a reajustar salários e preços de acordo com a expectativa mais alta.
Como se vê, isto não facilitaria a vida do BC. Pelo contrário, se a mudança da meta for percebida como precedente para novas mudanças à frente, a expectativa contemplaria esta eventualidade. Ainda seguindo nosso exemplo, em vez de 4%, se moveria um pouco mais, digamos, 4,5%, incorporando o risco de novas alterações. Isto se traduziria em inflação ainda mais alta, acima, portanto, da meta.
Neste caso, o BC teria de elevar ainda mais a taxa de juros, na verdade, mais do que o aumento das expectativas, para trazê-la de volta à meta, isto é, juro real mais alto, logo, crescimento mais baixo.
A proposta é, pois, o proverbial tiro no pé, especialidade dos nossos heterodoxos.
Dado, porém, que o cacique da referida tribo é coautor de livros e artigos com o futuro presidente do BC, eu bem que gostaria de saber opinião deste acerca da proposta do seu mentor: subscreve, ou finge que não é com ele?
Com a palavra, Gabriel Galípolo.
O Estado de S.Paulo - SP 28/10/2024
O presidente Lula da Silva insiste em remontar a economia mundial, buscar alternativas ao dólar e dar proeminência aos países do “sul”, uma entidade ainda mal definida, mas pouco avançou, até agora, na tarefa de resgatar o Brasil da mediocridade. Com crescimento previsto de 3% neste ano, 2,2% no próximo e 2,5% em 2029, o País continua no pelotão de trás da corrida econômica, segundo as novas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Em coro com outros políticos brasileiros, o presidente pode falar mal do fundo, acusá-lo de servir aos Estados Unidos, de agir contra os interesses do mundo emergente e em desenvolvimento e de impor políticas desastrosas. Mas ainda lhe faltaria explicar por que as projeções formuladas no mercado brasileiro são tão parecidas com as do FMI – e às vezes piores em alguns detalhes.
Segundo o boletim Focus distribuído no dia 21, a economia do Brasil, medida pelo Produto Interno Bruto (PIB), deve crescer 3,05% em 2024, 1,93% em 2025 e 2% em cada um dos dois anos seguintes. As projeções também apontam inflação de 4,5% neste ano, de 3,99% no próximo e taxas sempre superiores ao centro da meta, 3%, até 2027.
Inflação seguidamente acima da meta é um claro desafio para o Banco Central (BC), entidade responsável pela defesa da moeda. A resposta é dada com elevação de juros ou manutenção de juros altos. Por isso, a taxa básica, a Selic, estará em 11,75% no fim deste ano, em 11,25% em dezembro de 2025, em 9,50% no encerramento de 2026 e em 9% no final do período. Taxa real de juros elevada pode atrair capital especulativo, mas é normalmente um obstáculo ao consumo, ao investimento produtivo e ao crescimento da atividade econômica.
O presidente pode falar mal do setor financeiro e acusá-lo de operar contra os interesses do povo. Mas nesse mercado, como em qualquer outro, os agentes trabalham normalmente em busca de lucro e, nos piores momentos, da preservação de seu capital e de sua sobrevivência nos negócios.
Motivações semelhantes serão encontradas em pequenos, médios e grandes empresários de todos os setores. Os mais modestos produtores do campo, nas áreas menos desenvolvidas, provavelmente elevarão suas ambições se conseguirem ir pouco além do mínimo necessário. Por que não ampliar e reformar a casa, comprar uma televisão mais moderna e pensar numa educação mais ambiciosa para os filhos?
O presidente Lula, é claro, entende e apoia essas ambições, mas parece esquecer ou menosprezar, em alguns momentos, as condições necessárias para realizá-las numa economia capitalista, ou ainda capitalista, como a brasileira. Essas condições incluem, nos níveis básicos, o crescimento econômico prolongado e seguro, com previsibilidade suficiente para as decisões de investimento privado.
Incluem também, obviamente, uma gestão prudente e eficaz das verbas públicas, com investimentos bem planejados e bem executados, contenção dos gastos de custeio e, se possível, diminuição do peso tributário, sem favores a grupos empresariais, setores de negócios e apoiadores políticos.
Tudo isso é obviamente complicado, ainda mais num país onde congressistas controlam uma enorme parcela – muito maior do que se observa em economias mais desenvolvidas, como a americana – das emendas orçamentárias. Nada pode justificar a pulverização de dezenas de bilhões de reais enviados, por meio de emendas, às bases eleitorais de parlamentares. Trata-se de verbas da União destinadas, por esse meio, a obras e atividades de responsabilidade local ou estadual e, em muitos casos, sem conexões claras com políticas e programas federais. Não é exagero qualificar esse procedimento como privatização de recursos da União para objetivos particulares de políticos e de seus apoiadores. É perfeitamente justificável a intervenção recente do Supremo Tribunal Federal, nesse jogo, com a exigência de informações suficientes sobre a destinação dessas verbas.
O presidente Lula e demais líderes do Brics podem ter excelentes motivos para cobrar mudanças na ordem econômica mundial e nas instituições multilaterais – embora o presidente brasileiro exiba, normalmente, notável ignorância dos objetivos, critérios e atividades do FMI e de outras entidades. Lula chega a exibir alguma ingenuidade nessas discussões. Ele parece desconhecer, por exemplo, a participação chinesa (6,40%) no total de recursos do fundo, só superada, quando se consideram as parcelas individuais dos países, pela dos Estados Unidos (17,42%). Alemanha, maior economia da Europa Ocidental, detém 5,59%. O Brasil, 2,32%. Mas poucos países votam com base apenas em sua participação financeira. A maior parte, incluído o Brasil, é vinculada a grupos e vota dessa maneira.
Em seu terceiro mandato, o presidente Lula exibe, de vez em quando, recaídas no petismo de quatro décadas atrás, como quando tenta mandar nas agências reguladoras. Isso é em parte compensado pela atualidade do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e de sua colega do Planejamento, Simone Tebet. Bem ou mal, o petismo presidencial acaba neutralizando, em boa parte, o direitismo extremo ainda perigoso para a democracia brasileira.
Globo Online - RJ 28/10/2024
Com menos de um mês no cargo, o presidente da Vale, Gustavo Pimenta, apresentou nesta sexta-feira resultados financeiros bem recebidos pelo mercado e pôde comemorar o acordo de reparação financeira pelo desastre ambiental de Mariana (MG), ocorrido em 2015. Perto do fechamento do mercado, pouco antes das 16h, a Vale saltava pouco mais de 4% na Bolsa.
O pregão reage tanto à confirmação do acordo sobre Mariana, firmado nesta sexta-feira em Brasília, quanto aos resultados financeiros, divulgados na noite de quinta-feira, quando o mercado já estava fechado. O lucro líquido do terceiro trimestre ficou em R$ 13,4 bilhões, queda de 3,4% ante igual período de 2023, mas as receitas subiram 2% no mesmo período, para R$ 53 bilhões.
Acordo de Mariana já reduziu o lucro
A queda no lucro foi em parte explicada pelo acordo sobre Mariana – o rompimento de uma barragem de rejeitos da Samarco, empresa cujo controle é dividido, meio a meio, entre a Vale e a BHP Billiton, outra gigante global da mineração, deixou 19 mortos na cidade mineira e arrastou um mar de lama pelo Rio Doce, até o litoral do Espírito Santo.
As mineradoras já vinham investindo em ações de reparação, mas um acordo formal com a União, governos estaduais e intermediação judicial foi firmado somente nesta sexta-feira. A compensação custará um total de R$ 170 bilhões, como já havia sido anunciado – R$ 38 bilhões já aplicados pelas empresas, enquanto a Samarco gastará mais R$ 32 bilhões em obrigações e outros R$ 100 bilhões em compensações serão pagos pelos próximos 20 anos.
Neste quarto trimestre, a Vale gastará R$ 3,7 bilhões relacionados ao acordo da Samarco, informou a companhia, em teleconferência com analistas de mercado, nesta sexta-feira. No ano que vem, as despesas serão de R$ 11 bilhões e, em 2026, ficarão em R$ 6 bilhões, caindo gradualmente ano a ano.
Por isso, a Vale aumentou em US$ 1 bilhão, para um total de US$ 4,7 bilhões, as provisões para perdas relacionadas à Samarco em seu balanço financeiro. As provisões funcionam como uma “reserva” para perdas esperadas. Significa que a empresa separa, no balanço, um valor que estima que terá que gastar no curto e médio prazo. Mesmo que o gasto não tenha sido ainda efetivado, pelas regras contábeis, as provisões são abatidas do lucro final.
Cotação menor do minério de ferro atrapalha
Outro motivo para o lucro menor no terceiro trimestre foi a queda de 7,6% na geração de caixa (medida pelo Ebitda, sigla em inglês que significa ganhos antes de juros, impostos, depreciação e amortização), para R$ 20,049 bilhões.
Esse recuo foi explicado pelas menores cotações globais do minério de ferro, de longe o principal produto da Vale. Mesmo assim, a geração de caixa do terceiro trimestre ficou acima do inicialmente estimado por alguns analistas, principalmente porque o volume de produção e vendas entre julho e setembro foi maior. Isso já havia sido informado no relatório de produção, divulgado semana passada, e se refletiu na alta de 2% das receitas.
Outro fator que permitiu à Vale registrar uma geração de caixa maior do que o inicialmente estimado por analistas foram custos menores. O indicador de custo mais usado pela mineradora ficou em US$ 20,60 por tonelada de minério de ferro produzida, 6% abaixo do terceiro trimestre de 2023.
Apenas em setembro, o indicador ficou em US$ 18,20 por tonelada, com tendência de queda para este quarto trimestre, segundo a mineradora. No relatório sobre os resultados financeiros, a empresa avaliou que “está confiante” em atingir a banda inferior de sua meta para o indicador de custos, que vai de US$ 21,50 a US$ 23,00 por tonelada. Segundo Pimenta, é possível chegar a um custo abaixo US$ 20 por tonelada em 2026.
– Perdemos parte da nossa competitividade nos últimos anos, como resultado de várias coisas, incluindo algumas restrições que tínhamos em nossas operações, mas estou muito otimista que conseguiremos trazer a companhia de volta para um ambiente muito mais competitivo, baixando nossos custos – afirmou o presidente da Vale, na teleconferência com analistas.
Para analistas, números são positivos
Volume de produção maior e custo menor sustentaram avaliações positivas sobre os resultados por parte de analistas de bancos de investimento. “O destaque foi o desempenho de custos”, diz um relatório do Itaú BBA, de antes da teleconferência sobre os dados. “No geral, a Vale divulgou resultados sólidos”, segundo um relatório do Santander, também anterior à apresentação da diretoria da Vale.
Pimenta assumiu como presidente da Vale no dia 1º deste mês, após um conturbado processo de sucessão, marcado por disputas entre acionistas e tentativa de interferência política por parte do governo federal. A própria indefinição sobre quem substituiria Eduardo Bartolomeo, que comandou a Vale desde o início de 2019, logo após o acidente de Brumadinho, acabou tirando valor dos papéis da mineradora.
Além disso, analistas apontavam o acordo sobre Mariana e uma renegociação com o Ministério dos Transportes sobre a renovação antecipada de duas concessões ferroviárias como problemas que pesavam sobre os negócios – e, portanto, as cotações das ações – da Vale. Na teleconferência, Pimenta disse ter expectativa de que o acordo sobre as ferrovias seja atingido ainda este ano, sem dar detalhes.
Ações penalizadas
Em relatório, a corretora Genial Investimentos citou indicadores de valor em proporção da geração de caixa para sustentar que as ações da Vale estão “penalizadas”, cotadas abaixo até mesmo do desempenho passado da companhia. Mesmo com a alta desta sexta-feira, os papéis acumulam queda de 14% no ano.
“Acreditamos que a eliminação desses pesos, combinada com a perspectiva de uma recuperação parcial nos preços do minério de ferro, poderia liberar valor”, escrevem os analistas, que veem potencial de uma valorização de 28% nas ações nos próximos 12 meses.
O que não significa que a mineradora brasileira navegará em mar de almirante no longo prazo. “A situação macroeconômica da China continua vulnerável (apesar das discussões recentes sobre estímulos), o que pressiona todo o complexo de aço e cria uma sobrecarga significativa para os preços do minério de ferro”, diz um relatório do BTG Pactual.
Na teleconferência, os executivos da Vale procuraram minimizar os riscos, traçando uma visão menos pessimista sobre o cenário de demanda da China, mas Igor Guedes, analista da Genial Investimentos, vê como inevitável uma redução estrutural da demanda chinesa por minério de ferro no longo prazo, à medida que o crescimento econômico do gigante asiático desacelera. Mesmo assim, as ações da Vale estariam baratas demais.
– Quando começamos a ver a capacidade de geração de caixa versus o que o investidor está pagando pelo papel, é ridiculamente barato. Embora seja arriscado, continuamos achando que a relação entre risco e retorno está valendo a pena. Mesmo com o minério de ferro para baixo, a capacidade de geração de caixa é tão alta que vai continuar pagando dividendos – explicou Guedes.
Valor - SP 28/10/2024
O presidente da Vale, Gustavo Pimenta, afirmou que a empresa tem algumas alavancas-chave em sua estratégia. O executivo frisou que a companhia busca atingir a capacidade de produção de minério de ferro e ao mesmo tempo que persegue uma cultura de segurança e performance.
Segundo ele, em teleconferência com analistas sobre os resultados do terceiro trimestre, a Vale perdeu um pouco da competitividade, mas as alterações que serão implementadas pela nova gestão vão permitir retomar essa agenda. Pimenta, que era vice-presidente executivo de finanças e relações com investidores, comanda a mineradora desde o começo de outubro.
Pimenta ressaltou que a companhia vai continuar a estratégia de dar prioridade a valores na comparação com volumes.
No passado, antes dos rompimentos das barragens da Samarco, em Mariana, e da própria Vale, em Brumadinho, a companhia chegou a ter meta de atingir produção anual de 400 milhões de toneladas. Depois de Brumadinho, a empresa passou a ter limitações de produção e passou a ter como estratégia o foco em produzir minério de qualidade, o que chamou de “valor sobre volume” (valor over volume, em inglês).
O executivo lembrou que no atual momento, quando a companhia consegue atingir as metas de produção e elevá-las, a grande vantagem não vem só do volume - a meta para este ano é produzir entre 323 milhões e 330 milhões de toneladas -, mas, sim, da flexibilidade permitida.
“Depois de Brumadinho, perdemos a flexibilidade. Mais importante que o volume, é poder tomar as decisões de acordo com o mercado para maximizar a produtividade”, disse.
Rogério Nogueira, vice-presidente interino de soluções de minério de ferro, afirmou que a Vale gostaria de reduzir a oferta de produtos de alta sílica. “Estamos muito orientados à maximização de valor do portfólio”, disse.
Pimenta afirmou que um dos focos da mineradora em sua gestão estará na tomada de decisões cruciais para melhorar a competitividade da empresa. “Vamos acelerar a estratégia de minério de ferro premium”, frisou Pimenta em sua primeira teleconferência de resultados como presidente da companhia. Ele acrescentou que, em suas primeiras semanas no comando da empresa, foram definidas as áreas de foco daqui para frente.
O executivo disse que a empresa quer atingir no futuro produção de 350 milhões de toneladas, com 80% disso em produtos de alta qualidade, como produtos de Carajás e aglomerados.
Acrescentou ainda que a empresa vai trabalhar em estreita colaboração com a sociedade e afirmou que cada pilar será trabalhado com objetivos concretos.
Um dos focos continuará na segurança e Pimenta disse que a empresa vai seguir trabalhando para eliminar as barragens a montante no país. Das 30 estruturas desse tipo no portfólio da empresa, 16 já foram descaracterizadas.
Sobre o lado operacional, lembrou que a Vale teve no terceiro trimestre a maior produção de minério de ferro desde 2018 e afirmou que está confiante de terminar o ano com produção entre 323 milhões e 330 milhões de toneladas de minério de ferro produzidas.
Minérios e transição energética
O presidente da Vale afirmou nesta sexta-feira que o Brasil tem muitas jazidas de minérios para a transição energética. Em teleconferência, Pimenta citou o níquel como um dos produtos importantes para a companhia no cenário de transição energética. O executivo também reforçou a importância do Brasil no portfólio: “Brasil tem enorme potencial em termos de reservas de minérios.”
“Há a discussão de como acelerar o desenvolvimento do país. Temos avançado nas discussões sobre a regulação de cavidades de mineração. Sabemos que a legislação precisa ser melhorada. Vamos poder destravar potencial do país e da Vale para aumentar a produção”, afirmou. “A vantagem da nossa carteira nos metais está nos nossos ativos.”
Questionado sobre possibilidades de parcerias, Shaun Usmar, presidente da Vale Base Metals disse: “Nossa maior oportunidade [em termos de crescimento] está dentro da empresa”.
O Estado de S.Paulo - SP 28/10/2024
Em sua primeira videoconferência com analistas para comentar os resultados da Vale como presidente da empresa, nesta sexta-feira, 25, um dia após a divulgação do balanço do terceiro trimestre, Gustavo Pimenta deixou claro as suas prioridades. Falou sobre temas estratégicos para a companhia, como as apostas para aumentar a participação na transição energética. Ressaltou a busca de corte de custos, tema a que já se dedicava no cargo anterior, como vice-presidente financeiro. Abordou também a questão de negociações com o governo federal de temas pendentes, como a renovação de concessão de trens, e celebrou o fim de um impasse de quase nove anos, no dia da assinatura do acordo de Mariana, além de falar sobre a política em relação a outras barragens. Confira abaixo o que o CEO falou sobre cinco temas.
Apostas em metais da transição energética
Pimenta disse que a mineradora quer ser líder no segmento de metais da transição energética, como cobre e níquel. A meta, segundo o CEO, é melhorar o mix desses produtos e acelerar o crescimento da produção principalmente de cobre, com custos cada vez menores.
“Reduzimos mais uma vez o guidance (tendência) do custo all-in (o custo total para um cliente) do cobre”, informou Pimenta, ressaltando que prevê entregar o guidance de produção de 2024 no limite superior.
A Vale atualizou a sua estimativa de custo all-in de cobre em 2024 para entre US$ 2.900 e US$ 3.300 por tonelada. A projeção anterior girava entre US$ 3.300 e US$ 3.800.
Sobre o níquel, metal crítico para a transição energética, o executivo afirmou que há um espaço grande no mercado. “Mas a gente precisa ter o portfólio correto de níquel, a depender das condições de mercado, sendo flexível para navegar por qualquer ciclo também”, disse Pimenta.
De acordo com o CEO da Vale Metais Básicos, Shaun Usmar, a Vale já tem passado por algumas melhorias no custo unitário do níquel, tem manutenções programadas e ressaltou que estão sendo feitos investimentos na área.
Corte de custos
Pimenta disse que o objetivo é levar a companhia para a parte inferior da curva de custos.
“Quanto mais eu olho a nossa base de custo mais confiante estou na nossa condição de chegar nesse guidance (abaixo de US$ 20 a tonelada até 2025), vai ser uma prioridade-chave para mim. Temos visto muita melhoria na nossa capacidade de retirar custos do sistema operando melhor”, disse Pimenta, citando ainda programas de eficiência concomitantes que a companhia está fazendo “e que também estão amadurecendo”.
“Estamos partindo para o nosso sólido progresso para desenvolver a Visão Vale 2030, que pretendemos detalhar no nosso Vale Day no início de dezembro”, disse Pimenta, ressaltando que o movimento parte de três pilares.
O primeiro pilar é a manutenção do foco em segurança e excelência operacional para melhorar a competitividade; o segundo se refere a um portfólio superior, “vamos acelerar a nossa estratégia de minério ferro premium”; e o terceiro é mostrar aos stakeholders (públicos de interesse) que a empresa é confiável.
Nosso objetivo é produzir cerca de 350 milhões de toneladas de ferro, dos quais 80% a 90% serão produtos de alta qualidade”, informou. “Temos uma plataforma única de metais básicos com chance de crescimento muito grande”, adicionou.
Acordo de Mariana
Ao falar sobre o acordo de reparação da tragédia ocorrida em 2015 em Mariana (MG), assinado nesta sexta-feira, 25, o CEO da Vale reafirmou que a jurisdição correta de negociação é o Brasil (e não o Reino Unido, onde corre um julgamento relativo à empresa BHP, sócia da Vale na Samarco, cuja represa se rompeu na cidade mineira).
“A decisão de se assinar o acordo hoje é um passo importantíssimo, nós sempre acreditamos, e hoje conseguimos corroborar isso, que a jurisdição correta para se fazer o acordo é o Brasil e conseguimos isso de forma exitosa”, afirmou, durante videoconferência com analista para comentar o resultado do terceiro trimestre do ano.
O governo federal formalizou no evento o compromisso firmado com as empresas para o pagamento de R$ 100 bilhões em recursos novos destinados a políticas de reparação socioambientais. Esse valor será destinado ao Poder Público ao longo de 20 anos.
Além disso, há R$ 32 bilhões em obrigações a fazer, diretamente pelas empresas. Ou seja, são R$ 132 bilhões em valores novos e R$ 38 bilhões já desembolsados via Fundação Renova, totalizando o valor global de R$ 170 bilhões.
Eliminação de barragens à montante
Pimenta afirmou que a mineradora segue com a meta de eliminar todas as barragens à montante (esse tipo de barragem tem os seus rejeitos depositados nela mesmo, formando uma “praia” de resíduos da mineração) no Brasil, e afirmou que o acordo oficializado nesta sexta-feira com o governo, em Brasília, sobre o total de R$ 170 bilhões para reparação dos danos decorrentes da tragédia de Mariana, Minas Gerais, foi uma solução benéfica para todos.
“O dia de hoje marca capítulo importante da nossa história, com assinatura do acordo, que reforça o compromisso da Vale com a reparação justa. Chegamos a uma solução benéfica para todas as partes. O acordo de Marina confirma que instituições brasileiras são sólidas”, disse Pimenta.
Renovação de concessões de trens
A mineradora e o governo, segundo Pimenta, estão avançando nas conversas para a renovação das concessões dos trens usados pela mineradora. A expectativa é de que haja uma solução para o caso até o final deste ano.
“Temos avançado”, disse Pimenta, ao responder a uma pergunta de um analista na teleconferência de resultados. “Tem alguns procedimentos jurídicos que devem ser seguidos. Mas esperamos que até o final do ano a gente consiga resolver essa discussão.”
Na terça-feira,, 22, o ministro dos Transportes, Renan Filho, disse que o governo federal está próximo de fechar o acordo com a Vale para o pagamento de outorgas não quitadas na renovação antecipada de ferrovias. “Será neste ano com certeza”, afirmou ao Estadão/Broadcast.
A mesa de negociações foi formada no início do ano e, em maio, conforme antecipou o Estadão/Broadcast, a companhia apresentou a proposta de R$ 16 bilhões. O governo, que inicialmente cobrava R$ 25,7 bilhões, pediu uma nova proposta à companhia. O novo valor, segundo Renan Filho, é próximo de R$ 20 bilhões.
IstoÉ Dinheiro - SP 28/10/2024
O governo federal assinou, nesta sexta-feira (25), um acordo para pagamento de R$ 132 bilhões em indenização pelas empresas envolvidas na tragédia de Mariana, em Minas Gerais, em 2015. O valor visa reparar os prejuízos causados pelo rompimento da Barragem do Fundão, administrada pela Samarco, empresa controlada pelas mineradoras Vale (brasileira) e BHP Billiton (anglo-australiana).
O primeiro acordo para indenizar as vítimas foi assinado em 2016, mas já sabia-se que uma repactuação seria necessária diante da dimensão da tragédia. Foram abertas, também, diversas ações judiciais sobre o caso. Em 2018, as negociações foram retomadas.
Dos R$ 132 bilhões previstos no acordo, R$ 100 bilhões são novos recursos que devem ser pagos em até 20 anos pelas empresas ao poder público, para serem aplicados em diversas ações. As companhias também destinarão R$ 32 bilhões para custeio de indenizações a pessoas atingidas e de ações reparatórias que permanecerão sob sua responsabilidade.
Elas afirmam, ainda, já terem desembolsado R$ 38 bilhões na reparação socioambiental, por meio da Fundação Renova, criada pelas empresas para conduzir as ações de reparação. Com a assinatura do acordo, a fundação será extinta, e a própria Samarco assumirá as obrigações.
Em cerimônia no Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cobrou investimentos em prevenção a esse tipo de evento.
“Eu espero que as empresas mineradoras tenham aprendido uma lição. Ficaria muito mais barato ter evitado o que aconteceu, infinitamente mais barato. Certamente não custaria R$ 20 bilhões evitar a desgraça que aconteceu”, disse Lula, criticando modelos de privatização.
“É muito difícil negociar com uma corporation que a gente não sabe quem é o dono e que tem muita gente dando palpite. E que, muitas vezes, o dinheiro que poderia ter evitado a desgraça que aconteceu é utilizado para pagar dividendos”, acrescentou.
Lula ainda cobrou de todos os agentes públicos envolvidos que as ações sejam acompanhadas de perto, para garantir a reparação às vítimas. “A gente não está lidando com coisas estranhas, está lidando com o ser humano. A gente, possivelmente, não consiga nunca devolver a totalidade dos prejuízos que essas pessoas tiveram, que tem o prejuízo psicológico, além das mortes, tem o prejuízo das coisas que as pessoas gostavam e que nunca mais vão ver e que não tem substituto”, disse.
A tragédia humana e ambiental de Mariana ocorreu em 5 de novembro 2015, com o rompimento da barragem de rejeitos de mineração. O distrito de Bento Rodrigues foi totalmente destruído pela lama. Dezenove pessoas morreram, três estão desaparecidas até hoje e 600 pessoas ficaram desabrigadas.
Aproximadamente 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos tóxicos foram despejados no meio ambiente, atingindo 49 municípios em Minas Gerais e no Espírito Santo. A lama percorreu 663 quilômetros pela Bacia do Rio Doce, até atingir o mar do litoral capixaba.
O advogado-geral da União, Jorge Messias, explicou que as tratativas feitas, até então, foram insuficientes, e novas negociações atravessaram 2023 e 2024, já pelo governo Lula. Os termos não previam, por exemplo, a retirada de rejeitos, ações de saúde coletiva e indenizações individuais, que estão previstos na nova repactuação.
“Hoje estamos entregando um acordo possível”, disse Messias. “[Quero] dizer para as vítimas, para a população da Bacia do Rio Doce, que nós temos lado e que não tenham dúvida que, todo acordo que foi construído, foi atendendo à reivindicação histórica das comunidades”, acrescentou.
Vítimas
O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que representa as vítimas da tragédia, afirmou, entretanto, que não teve assento na mesa de negociação da repactuação, “o que foi negado sob alegação de sigilo pelas empresas e pelo Judiciário”, mas reconheceu a importância e os avanços do acordo.
“Esperamos que se efetivem os vários programas que estão previstos, inclusive o MAB ajudou a propor vários deles. É um avanço no acordo a parte mais coletiva”, disse à Rádio Nacional o coordenador nacional do MAB, Joceli Andrioli, cobrando a participação dos atingidos na implementação do acordo e fiscalização das ações.
Para o movimento, o valor acordado é insuficiente para alcançar a reparação integral dos direitos dos atingidos e do meio ambiente. “Neste sentido, a luta segue por indenizações justas”, disse Andrioli, explicando que uma grande lacuna é o direito individual, onde os valores são muito baixos, de R$ 35 mil aos atingidos em geral e R$ 95 mil aos pescadores e agricultores afetados.
“Reconhecemos a importância do acordo e seus avanços para os atingidos, embora o mesmo apresente insuficiências. O crime em Mariana e todas as violações decorrentes dele são resultado direto do processo de privatização, que explora todo povo brasileiro, se apropria de nossas riquezas e beneficia exclusivamente o sistema financeiro e a ganância do grande capital”, explica o movimento, em nota.
Em 2023, a Vale registrou lucro líquido de R$ 39,9 bilhões, enquanto a BHP teve lucros de quase R$ 45 bilhões no ano fiscal encerrado em junho deste ano.
Por outro lado, no novo acordo, o movimento destaca alguns avanços que “sempre estiveram presentes nas pautas de reivindicações das lutas”. Eles citam como positivo o protagonismo do Estado na condução do processo de reparação; os fundos específicos destinados aos povos indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais, às mulheres, aos pescadores e agricultores familiares; e a constituição do fundo perpétuo para ações em saúde, a continuidade da assessoria técnica independente, a política de saneamento, retomada econômica, fundo para enchentes, infraestrutura e a questão ambiental.
“Consideramos que, após nove anos de injustiças, sofrimento e violações de direitos, o acordo proposto abre um cenário de oportunidades para conquistas importantes, resultado de um intenso processo de luta das populações atingidas e das forças aliadas, em toda Bacia do Rio Doce e litoral capixaba”, acrescenta a nota.
O acordo assinado hoje será homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para, segundo a Corte, “evitar a contínua judicialização de vários aspectos do conflito [no Brasil] e o prolongamento da situação de insegurança jurídica”. Até então, as ações eram tratadas pela Justiça Federal em Minas Gerais.
Em Londres, outra ação de indenização começou a ser julgada nesta semana. O processo envolve cerca de 620 mil vítimas e busca que a mineradora BHP Billiton, acionista da Samarco sediada no Reino Unidos, seja condenada ao pagamento da indenização. A previsão é que o julgamento dure até março de 2025 e mais três meses para que a juíza britânica Finola O’Farrell pronuncie a sentença.
O advogado-geral da União, Jorge Messias, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o presidente Lula durante a cerimônia de assinatura de acordo de repactuação da reparação dos danos da tragédia de Mariana – Marcelo Camargo/Agência Brasil
A pagar
Do total de R$ 100 bilhões a serem pagos ao poder público, R$ 40,73 bilhões serão destinados diretamente aos atingidos. Outros R$ 16,13 bilhões serão aplicados na recuperação ambiental. Uma parcela de R$ 17,85 bilhões será reservada para fins socioambientais com reflexões aos indiretamente atingidos e ao meio ambiente.
Para melhorias em saneamento e rodovias estão previstos R$ 15,6 bilhões, enquanto o restante será destinado aos municípios afetados (R$ 7,62 bilhões) e a aplicações institucionais, de transparência e outros fins (R$ 2,07 bilhões).
A primeira parcela, no valor de R$ 5 bilhões, deverá ser paga 30 dias após a assinatura do acordo e seguirá um cronograma de pagamento contínuo, ano a ano, até 2043. Os valores anuais variam entre R$ 4,41 bilhões, previstos para a última parcela, em 2043, e R$ 7 bilhões, o mais alto a ser pago em um ano, em 2026.
Entre as ações previstas pelo governo federal está o Programa de Transferência de Renda (PTR), sob responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA). Ele prevê R$ 3,75 bilhões para um auxílio mensal a pescadores e agricultores atingidos no valor de 1,5 salário mínimo por até quatro anos.
Um total de R$ 8 bilhões está destinado à realização de um modelo de autogestão dos próprios indígenas, povos e comunidades tradicionais, acompanhados pela União, para assegurar o direito ao recebimento de auxílio financeiro e verbas reparatórias a outros povos e comunidades não reconhecidas.
Recursos da ordem de R$ 14,13 bilhões estarão sob responsabilidade do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo para serem aplicados em dois fundos voltados ao meio ambiente.
O acordo prevê R$ 12 bilhões para aplicação em saúde coletiva na Bacia do Rio Doce. Deste total, R$ 3,6 bilhões serão investidos em infraestrutura e equipamentos e R$ 8,4 bilhões, na constituição de um fundo perpétuo que utilizará os rendimentos em custeio adicional do Sistema Único de Saúde (SUS( na região da Bacia do Rio Doce.
O saneamento básico nos municípios da bacia deverá contar com R$ 11 bilhões, a serem aplicados com o propósito de assegurar e antecipar as metas de universalização, com redução de tarifas.
A fazer
Entre as obrigações do novo acordo que permanecem com as empresas estão a retirada de 9 milhões de metros cúbico de rejeitos depositados no reservatório da usina hidrelétrica Risoleta Neves. Ela está situada na Bacia do Rio Doce e ocupa uma área de mais de 83 mil quilômetros quadrados nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo.
As empresas ficam obrigadas, ainda, a finalizar o reassentamento nas regiões de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, outro distrito de Mariana atingido pela lama, recuperar 54 mil hectares de floresta nativa e 5 mil nascentes na Bacia do Rio Doce, e realizar o Gerenciamento das Áreas Contaminadas.
Soma-se a isso a implantação do Programa Indenizatório Definitivo (PID), que é voltado principalmente para os atingidos pela tragédia que não conseguiram comprovar documentalmente os danos sofridos. Eles passam a ter direito ao recebimento de indenização, de R$ 35 mil aos atingidos em geral e R$ 95 mil aos pescadores e agricultores afetados. A estimativa é de que mais de 300 mil pessoas terão direito a receber esses valores, totalizando R$ 11,5 bilhões.
Outras 20 mil pessoas devem receber R$ 13 mil pelos danos à água, pessoas que tiveram suas atividades financeiras, produtivas ou renda comprometidas pelo rompimento da Barragem de Fundão.
Valor - SP 28/10/2024
Segundo o escritório, seus clientes buscam reparações por danos morais e materiais não contemplados no acordo fechado no Brasil; análise do caso na Justiça inglesa deve ir até março de 2025
O escritório Pogust Goodhead enviou comunicado à imprensa afirmando que o acordo de reparação pela tragédia de Mariana, assinado entre as mineradoras Samarco, Vale, BHP, União e estados, nesta sexta-feira (25), não vai gerar duplicidade de indenizações pela Justiça brasileira e pela Justiça inglesa. O escritório é o responsável pela ação ajuizada contra a BHP na Inglaterra.
Segundo o escritório, seus clientes não foram incluídos nas negociações e buscam reparações por danos morais e materiais que não estão contemplados no acordo no Brasil. Na ação inglesa, o Pogust Goodhead representa 46 municípios e 620 mil vítimas.
De acordo com o escritório, os tribunais ingleses determinaram que o julgamento na Inglaterra pode prosseguir independentemente dos eventos no Brasil. A análise do caso na Justiça inglesa começou na segunda-feira (21) e a previsão é que dure até março de 2025.
Pogust Goodhead: valores do acordo não fazem justiça
Na avaliação do escritório, os valores definidos no acordo brasileiro não cobrem os prejuízos sofridos pelas vítimas, que continuam lutando por justiça e reparações integrais. O Pogust critica a forma que foi conduzida a negociação e as condições acertadas.
“A assinatura deste acordo só demonstra, portanto, a relevância da ação inglesa. Infelizmente, as negociações no Brasil ocorreram a portas fechadas, sem transparência, e foram encerradas sem participação dos atingidos. Além disso, o acordo prevê que parte da reparação será diluída em 20 anos, ou seja, 30 anos após o desastre”, diz a nota.
“A ação inglesa tem como principal objetivo responsabilizar publicamente a BHP pela tragédia de Mariana e representa uma oportunidade única para que as vítimas possam contar suas histórias. Além disso, estabelecerá um precedente histórico, tornando mais difícil para as empresas multinacionais negligenciarem sua responsabilidade nas comunidades em que operam”, complementou.
A Vale e a BHP são acionistas da Samarco. O acordo no Brasil estabelece o pagamento de R$ 170 bilhões das mineradoras à União, estados e municípios afetados.
Dos R$ 100 bilhões, R$ 40,7 bilhões serão repassados pelo poder público para pessoas diretamente atingidas, R$ 16,1 bilhões para a recuperação ambiental, R$ 15,6 bilhões para obras de saneamento e rodovias, R$ 7,6 bilhões para municípios da calha do Rio Doce e encerramento da ação civil pública de Mariana e R$ 2 bilhões para fortalecimento institucional, reforço na fiscalização de barragens e ações de controle social e transparência.
Na quinta-feira (24), o STF assumiu a responsabilidade sobre a mesa de repactuação, que estava sob os cuidados do Tribunal Regional da 6ª Região (TRF-6) no caso do acordo de Mariana (MG). O objetivo é evitar a judicialização futura entre os estados atingidos – Minas Gerais e Espírito Santo – e a União e garantir a preservação da jurisdição nacional no caso.
Valor - SP 28/10/2024
Do total de R$ 170 bilhões do acordo, R$ 32 bilhões são de responsabilidade da Samarco, incluindo indenização, reassentamento e recuperação ambiental
O vice-presidente executivo interino de finanças e relações com investidores da Vale, Murilo Muller, disse nesta sexta-feira (25) que os desembolsos sobre o acordo de Mariana serão reduzidos ao longo do tempo.
Em teleconferência de resultados do terceiro trimestre, Muller afirmou que essa redução gradual da contribuição da Vale considera que a Samarco irá financiar totalmente a reparação após 2031, seguindo fim do “ramp-up” (desenvolvimento) das operações. Do total de R$ 170 bilhões do acordo, R$ 32 bilhões são de responsabilidade da Samarco, incluindo indenização, reassentamento e recuperação ambiental.
Segundo Muller, a dívida líquida expandida da companhia chegou aos US$ 16,5 bilhões com o aumento de US$ 1 bilhão em provisão da Samarco.
Sobre os resultados do trimestre, o executivo disse que a Vale atingiu uma geração de fluxo de caixa livre de US$ 1,6 bilhão, usada para remunerar os acionistas. “Estamos confiantes em entregar a meta de custo de minério de ferro para o ano”, afirmou.
Globo Online - RJ 28/10/2024
Marcas que assinam roupas, bolsas ou carros de luxo e são objetos de desejo no mundo todo agora são vistas em outras vitrines: os edifícios de grandes metrópoles. A sofisticação, a elegância e a exclusividade associadas a grifes como Dolce&Gabbana, Fendi, Missoni, Porsche, Lamborghini e Baccarat ganham espaço no mercado imobiliário. A tendência brand building “desfila” em passarelas de Miami, nos Estados Unidos; e Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, onde os condomínios assinados por grifes são cada vez mais comuns.
A tendência já é forte na capital paulista, onde o lifestyle italiano virou uma valiosa carta na manga das incorporadoras de alto padrão. O objetivo é atrair e surpreender compradores de alto poder aquisitivo, acostumados a viajar o mundo e voltar cheios de referência quando o assunto é bom gosto. Missoni, Lamborghini, Versace e Pininfarina — o mesmo que assina o design dos bólidos da Ferrari — são alguns exemplos de parcerias firmadas em São Paulo com grifes italianas reconhecidas mundialmente.
O Rio vai mergulhar nessa onda com o primeiro projeto da Armani no país. A parceria da Patrimar com a marca do estilista italiano levou mais de um ano para ser costurada e vai fazer sua estreia em um residencial na Praia da Reserva, na Barra. Serão quatro torres e 190 apartamentos a partir de 240 metros quadrados, alguns com piscinas privativas. As obras terão início em 2025, com VGV estimado em R$ 1 bilhão. A partir desse lançamento, o Rio fará companhia a Miami, Dubai e Pequim, que já têm projetos da marca.
TENDÊNCIA INTERNACIONAL
Na Sunny Isles Beach, em Miami, os apartamentos Armani de 250 metros quadrados custam R$ 14 milhões. Os privilegiados moradores usufruem de estúdio de ioga, spa, academia, piscina aquecida, adega, sala de jogos e manobrista. No lançamento do projeto, Giorgio Armani explicou que tinha o desejo de ver sua estética de design em espaços interiores.
No Rio, o Armani/Casa da Barra seguirá o mesmo caminho. O CEO da Patrimar, Alex Veiga, conta que a parceria com a grife italiana é um jogo de ganha-ganha. Os compradores terão um produto único, a Armani fará sua estreia no Brasil em uma cidade mundialmente famosa, e a incorporadora reforçará sua marca de alto padrão.
— A Armani é referência mundial de sofisticação, elegância e luxo. Nosso namoro foi longo, porque eles são criteriosos em todos os detalhes. Vieram ao Rio para conhecer o terreno, visitaram outros projetos nossos e checaram as finanças da Patrimar. E estão certos. O maior patrimônio do Armani é o nome dele, não pode correr riscos — diz.
Nos projetos da Armani/Casa, o design das áreas comuns e dos móveis é do time do estilista italiano. A cada cinco anos, eles virão ao Rio para conferir se está tudo do mesmo modo que foi planejado. O objetivo é que, independentemente da passagem do tempo, os compradores sempre tenham um ativo tailor made. O conceito perpassa os projetos imobiliários assinados por marcas de moda e reafirma a exclusividade do produto.
Mas, quando se trata de parceria entre incorporadoras e montadoras de automóveis, a história é outra. Os prédios assinados por marcas como Porsche, Lamborghini e Bentley investem em tecnologia, sem abrir mão do design de luxo. Em Miami, a marca de carros favorita de James Bond ganhou uma versão em concreto: o Aston Martin Residences. A venda das 391 unidades foi mais rápida do que as aventuras do espião mais popular do cinema.
IstoÉ Dinheiro - SP 28/10/2024
A construtora Plano & Plano, investida da Cyrela, está avançando nos lançamentos na faixa 1 do Minha Casa Minha Vida, segmento que até pouco tempo atrás era renegado por muitas empresas porque dependia dos recursos incertos do orçamento da União.
A razão para o avanço está nas novas regras do programa habitacional que entraram em vigor neste ano e viabilizaram o desenvolvimento de projetos pelas construtoras com financiamentos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
Na metade deste ano, a Plano & Plano passou a lançar empreendimentos totalmente voltados para a faixa 1 do MCMV, via FGTS. De lá para cá, foram três projetos em São Paulo, totalizando 1,5 mil apartamentos, no valor total de R$ 300 milhões.
“A velocidade de venda da faixa 1 no primeiro mês após o lançamento foi de 60% a 70% dos apartamentos, versus uma média de 30% nas faixas 2 e 3”, contou a diretora de incorporação da Plano & Plano, Renée Silveira, em entrevista ao Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado). Os números ficaram acima das expectativas.
Lançamentos e vendas da Plano & Plano na faixa 1 do MCMV*
Parque do Carmo – Jacarandá (1º fase)
Lançamento: 28/9
Total de unidades: 609
Total de vendas: 184 unidades
Velocidade: 30% em duas semanas
Interlagos – Palmares
Lançamento: Julho
Total de vendas: 513
71% em cerca de dois meses
Interlagos – Campo Grande
Lançamento: julho 2024
Total de vendas: 161 unidades
Velocidade: 66% em cerca dois meses
*Fonte: Plano & Plano
Dados de vendas atualizados até 11/10
“Existe uma demanda reprimida. São poucas as construtoras que conseguem produzir imóveis para o público da faixa 1. O custo de construção e o preço dos imóveis subiram, e as pessoas desta faixa ficaram vivendo no aluguel, sem condições de comprar. Durante muitos anos não se conseguiu produzir quase nada para esse público”, disse Renée.
Nas regiões metropolitanas, construtoras como Tenda, Cury e MRV, por exemplo, atuam na faixa 1, mas essas unidades são minoria no mix. A Direcional, por sua vez, já anunciou que também vai aumentar o volume de projetos no segmento. Dentre as grandes, a Pacaembu é a única em que a faixa 1 representa a maior parte dos empreendimentos, o que é possível em uma linha de produção de casas em loteamentos nas cidades do interior.
No caso da Plano & Plano, há uma decisão de pisar no acelerador. “Devemos chegar a 30% dos lançamentos neste ano dentro da faixa 1”, estimou a diretora de incorporação. O foco da companhia está nas zonas leste e sul de São Paulo, onde há maior demanda da população de menor renda.
Até o fim do ano, serão mais três lançamentos na faixa 1: bairro de São Miguel (3 torres, 626 unidades, R$ 129 milhões), José Bonifácio (4 torres, 895 unidades, R$ 190 milhões) e Interlagos (4 torres, 917 unidades, total de R$ 169 milhões).
O maior dos empreendimentos fica no Parque do Carmo, numa área de 36 mil m² (oito campos de futebol), com 19 torres e um total de 2,4 mil apartamentos. Dado o grande porte, terá lançamentos ao longo de três fases ao longo dos próximos trimestres.
Histórico
A faixa 1 foi criada para atender as famílias com renda mensal de até R$ 2,6 mil, e que não tinham poder aquisitivo para comprar imóveis por conta própria. No modelo tradicional, o governo federal contrata os empreendimentos e repassa aos beneficiários com subsídios equivalentes a até 90% do valor do imóvel, originados em recursos do orçamento geral. Aí, as construtoras entram como prestadoras de serviço.
É diferente do que acontece nas faixas 2 e 3, (públicos de até R$ 4,4 mil e R$ 8,0 mil por mês) em que a grande maioria dos empreendimentos são feitos pelas próprias incorporadoras, que vendem as moradias ao beneficiários através de financiamentos subsidiados pelo FGTS.
O que ajudou a viabilizar os projetos da faixa 1, via FGTS, foi o corte de 4% para 1% na alíquota do Regime Especial de Tributação (RET) para projetos do segmento, o que aumentou o apetite das incorporadoras.
Outro ponto foi a extensão do prazo de financiamento de 30 para 35 anos na Caixa Econômica Federal, o que na prática permite às famílias diluir o valor das parcelas e acessar imóveis de preços mais altos.
Diversos governos estaduais criaram programas que oferecem subsídios complementares, na ordem de R$ 15 mil a R$ 30 mil, para as famílias de menor renda adquirirem imóveis por meio do Minha Casa Minha Vida.
Foi a partir dessa conjuntura, a Plano & Plano decidiu investir no ramo. Ela desenvolveu uma linha apartamentos de dois quartos e 32 metros quadrados, vendidos na média a R$ 189 mil (contra R$ 220 mil ns demais faixas). Para esse preço menor, a construtora fez economias principalmente nos itens de condomínio.
“Basicamente, a redução no custo se dá na fachada mais simples, e nas áreas comuns internas com menos acabamento em marcenaria, pedras e espelhos. Aí trocamos por tinta ou adesivo, por exemplo. E o condomínio tem menos mesas, cadeiras, e outros itens”, disse Reneé. “Já o tamanho de unidade e o acabamento interno dos apartamentos é praticamente igual a das demais faixas do programa”.
A companhia também não monta estandes, e as vendas são feitas em lojas que atendem diversos projetos. Por fim, os empreendimentos são erguidos em terrenos que contam com incentivos municipais para a habitação popular.
Money Times - SP 28/10/2024
Enquanto muitos setores da economia sofrem com a falta de vagas de trabalho, na construção civil o cenário é outro. O segmento é um dos que mais empregam no Brasil, sendo uma das bases da economia. Somente no primeiro semestre de 2024, foram gerados mais de 100 mil novos postos.
No entanto, o problema aqui muda de lado: a falta de mão de obra qualificada para as vagas. E eu te confirmo: se você perguntar para 10 construtoras, as 10 dirão que seus desafios passam pela busca de pessoas para o trabalho.
Impactos da falta de mão de obra no mercado imobiliário
A falta de profissionais qualificados nos empreendimentos imobiliários tem um impacto direto tanto no cronograma quanto nos custos das obras. Atrasos são comuns, já que trabalhadores menos preparados tendem a cometer mais erros, resultando em baixa produtividade e retrabalhos. Sem mão de obra capacitada, tarefas simples demoram mais para serem concluídas, o que prolonga o tempo de execução das etapas do projeto.
Além disso, a dificuldade em preencher posições-chave, como mestres de obras, engenheiros, eletricistas e encanadores torna ainda mais difícil manter o andamento das atividades. No aspecto financeiro, o impacto também acontece. A escassez de mão de obra faz com que a oferta de salários mais altos seja uma das únicas estratégias para atrair trabalhadores especializados, o que alavanca custos de folha de pagamento.
Assim, a gestão de obras se torna uma tarefa complexa, exigindo ajustes constantes em cronogramas e orçamentos para tentar compensar os desafios gerados pela falta de mão de obra.
Motivos da falta de mão de obra
Na busca pelos porquês da dificuldade em preencher as vagas, deparamo-nos com alguns pontos importantes. Entre eles, impossível não citar a falta de qualificação. Muitos trabalhadores ingressam no mercado sem o treinamento técnico necessário, o que resulta em uma força de trabalho menos preparada.
Outro ponto que atinge o tendão de Aquiles das empresas construtoras é o desinteresse de parte dos jovens pela área. Com o boom da tecnologia na última década, áreas ligadas a outros setores têm feito os olhos das novas gerações brilharem. Ainda mais se levarmos em conta a exigência física que a atuação em uma obra pede.
Dessa forma, a força de trabalho está envelhecendo — o que aumenta o número de aposentadorias e, consequentemente, faz crescer a demanda por novos profissionais.
Antídotos contra a falta de mão de obra
A primeira coisa que você precisa ter na sua empresa são pessoas capacitadas. Então, a principal estratégia deve ser o investimento em qualificação de quem já veste a camisa da companhia. Abriu uma nova vaga? Pense em quem já faz parte da equipe e pode ser promovido para novos desafios.
Se precisar, contrate treinamentos especializados para o seu time. Isso faz com que os colaboradores se sintam valorizados e, de quebra, tapa possíveis buracos na estrutura organizacional.
Outra alternativa que percebo nas estratégias das companhias do setor é a aposta na mecanização e na industrialização da construção. O uso de componentes pré-fabricados e métodos de construção modular permite que partes da obra sejam executadas em fábricas, onde as condições são controladas e reduzem a necessidade de mão de obra qualificada no canteiro.
Essa é uma opção interessante, porém nem todas as construtoras têm caixa suficiente para aportar nas últimas novidades que aparecem. Nesses casos, o arroz com feijão bem feito funciona. Ou seja, focar em oferecer melhores condições de trabalho, como remunerações competitivas, jornadas mais equilibradas e benefícios trabalhistas, a exemplo de assistência médica e planos de carreira bem estruturados.
A falta de mão de obra qualificada é um desafio digno da perda de sono dos construtores. Mas, assim como todo problema, há uma solução. Não dá para dizer que existe uma única alternativa, mas sim diversas. Por isso, é importante que cada empresa entenda o que faz sentido ou não para colocar em prática dentro da sua forma de trabalhar. Só assim é possível criar um mercado cheio de talentos e com oferta e demanda equilibradas.
Valor - SP 28/10/2024
Índice da Construção Civil da FGV terminou setembro – o resultado de outubro será divulgado na segunda-feira (28) – acumulado em 5,23% em 12 meses. Há um ano, o percentual era de 3,21%.
Nos últimos meses, a dificuldade de contratar mão de obra tem sido tema onipresente em encontros do setor imobiliário. Tornou-se comum ouvir que “o filho do pedreiro não quer ser pedreiro”, que há desinteresse dos jovens pelo setor e que o envelhecimento dos trabalhadores da construção já é uma realidade. Tudo isso levaria a uma pressão cada vez maior sobre o custo da mão de obra.
Esse aumento está acontecendo, mas vinha sendo amenizado por uma inflação mais suave dos preços dos materiais de construção. O cenário, no entanto, parece estar mudando.
Impacto em projetos para baixa renda
Em relatório publicado nesta semana, analistas do Itaú BBA, liderados por Daniel Gasparete, chamam a atenção para um aumento paulatino dos preços dos materiais de construção, que poderia impactar, principalmente, as companhias que constroem para clientes de baixa renda, como no programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV).
A inflação do setor é calculada pelo Índice Nacional da Construção Civil (INCC), calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). O indicador terminou setembro – o resultado de outubro será divulgado na segunda-feira (28) – acumulado em 5,23% nos últimos 12 meses. Há um ano, o percentual era de 3,21%.
Em setembro, houve alta de 0,61%, ante 0,64% em agosto. Na capital paulista, que concentra as incorporadoras de capital aberto e parte importante dos lançamentos do país, a taxa ficou pouco acima da média nacional, com 0,64% de aumento. Porto Alegre viu os preços subirem o dobro da média nacional no mês, com 1,23%.
Materiais de base
Porém, esses aumentos são baixos ao considerarmos o comportamento do INCC desde a pandemia. Durante 2021, o indicador acumulado ultrapassou 17%, justamente puxado pelo preço dos materiais de base, afetados pela disrupção das cadeias produtivas. Após esse período, esses preços ficaram estáveis ou até caíram.
Quem atua no setor já sente mudanças. Marcos Vinicius, sócio e diretor da incorporadora Habras, que constrói para a baixa renda, afirma que o preço dos materiais tem aumentado, principalmente em itens ligados ao cimento, como blocos de concreto. “Já houve dois aumentos neste ano. Subiram quase 16%”, diz.
Os analistas do Itaú BBA lembram que, apesar de a indústria do cimento no país ainda trabalhar com capacidade ociosa elevada, de 32%, as vendas aumentaram, o que pode levar a reajustes.
O Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (Snic) divulgou, no início do mês, que as vendas do produto subiram 10,4% em setembro, na comparação anual, para 5,8 milhões de toneladas. No acumulado do ano, o aumento é de 3,8%. Isso fez a entidade elevar sua projeção de alta vendas para 2024, agora em 2,8%.
Outros materiais de base já estão com preços maiores. “Para os componentes ligados às commodities, o pacote recente de estímulos da China se traduziu em recuperação considerável dos preços do aço e do cobre (alta de 10% em três meses)”, destacam os analistas.
Isso afeta mais o setor de baixa renda do que as incorporadoras voltadas para o médio e alto padrão, porque, por ser padronizada e usar métodos construtivos mais industrializados, a obra para a baixa renda tem uma participação maior do seu custo vindo dos materiais do que da força de trabalho.
Vendas em alta
As vendas também ocorrem com velocidade maior, porque há mais demanda e os preços são menores, o que atrapalha os reajustes de preço pela inflação ao longo da obra.
A dúvida é se um possível aumento nos custos poderá atrapalhar um setor que vem apresentando crescimento tão forte nos últimos meses, graças aos estímulos do MCMV e de programas estaduais e municipais. Os lançamentos das incorporadoras listadas em bolsa, focadas em baixa renda, subiram 38,5% no acumulado dos primeiros nove meses do ano, e as vendas cresceram 39% no mesmo período, segundo levantamento realizado pelo Valor com base em dados das prévias operacionais dessas empresas.
IstoÉ Dinheiro - SP 28/10/2024
Com apenas um mês de intervalo, dois dos principais operadores portuários de contêineres no Brasil foram vendidos para armadoras internacionais. Após a compra da Santos Brasil pela francesa CMA CGM, anunciada no final de setembro, a Wilson Sons divulgou em 20 de outubro, que será adquirida pela suíça MSC. Além da tendência de verticalização do setor, a falta de capacidade portuária, que eleva os preços para as empresas de transporte marítimo no Brasil, estão por trás desta tendência, segundo especialistas.
A Wilson Sons informou na ocasião que seu acionista controlador, o OW Overseas (Investments) Limited, celebrou contrato com a SAS Shipping Agencies Services Sàrl, subsidiária da MSC, para venda de 56,47% do capital da companhia, por R$ 4,3 bilhões. No final do mês passado, a CMA CGM comprou a fatia de 48% da Opportunity na operadora portuária Santos Brasil por R$ 6,3 bilhões.
Os dois ativos estavam no mercado há algum tempo, com diferentes compradores sendo cotados. Julio Favarin, sócio fundador da Garín Partners, assessoria financeira especializada em Infraestrutura, atribui o fato das duas operações terem saído do papel a dois principais fatores. O primeiro deles é o preço dos fretes marítimos terem disparado na pandemia, o que gerou mais caixa para armadores e permitiu intensificar aquisições, com destaque para ativos de operação portuária.
Do ponto de vista local, o especialista destaca a pouca oferta de espaço portuário que, apesar de ser um problema global, tem se mostrado ainda mais crítico no Brasil. Para ilustrar, Favarin cita que o Porto de Santos, o principal do País e da América do Sul, já tem operado acima da capacidade, o que leva mais movimentação para outros terminais, incluindo os da Wilson Sons na Bahia e no Rio Grande do Sul.
A demanda maior do que a oferta gera também um aumento significativo nos preços pagos pelos armadores, empresas responsáveis pelo transporte marítimo, aos operadores responsáveis pela administração dos portos. Sem a perspectiva de uma melhora nesta dinâmica no curto prazo, a compra das operações portuárias fica mais atrativa para os armadores.
“A percepção de custos para os próximos anos justifica uma aquisição. Se o armador precisa pagar muito mais para atuar em um terminal operado por terceiros, faz mais sentido ter um ativo próprio sobre o qual ele tenha mais gerência e possa garantir capacidade”, afirma Favarin.
Otimização
Os altos níveis de utilização interferem também na previsibilidade das operações, complementa o diretor-gerente da consultoria SOLVE Shipping Intelligence, Leandro Barreto. “É natural que os armadores queiram avançar sobre esse elo da cadeia que tem sido o calcanhar de Aquiles deles. É um movimento de defesa contra a falta de capacidade”, diz.
O consultor também vê benefícios setoriais vindos da operação. “Quando os armadores fazem esse tipo de aquisição, vêm com uma postura bastante importante de investimentos e expansão de capacidade, que é tudo que o Brasil está precisando”, acrescenta.
Fabrizio Pierdomenico, consultor e ex-secretário nacional de Portos, ressalta que, com a compra de terminais portuários, os armadores conseguem potencializar o resultado nas duas pontas, tanto do navio como da operação do terminal. “Em tese, esta verticalização traz escala, o que, baixa custos e aumenta a competitividade do terminal”, avalia.
Há quase 190 anos no mercado, a Wilson Sons atende mais de 5 mil clientes, incluindo armadores, importadores e exportadores, indústria de energia offshore, projetos de energia renovável, setor do agronegócio, segundo a companhia. O portfólio inclui terminais de contêineres na Bahia e no Rio Grande do Sul, 80 rebocadores, 23 embarcações de apoio offshore com bandeira brasileira, duas bases de apoio offshore na Baía de Guanabara (RJ), um centro logístico alfandegado em Santo André (SP) e dois estaleiros no Guarujá – SP.
Verticalização e Cade
O processo de verticalização, que consiste na mesma empresa atuando como armadora e operadora portuária, é alvo de controvérsias entre especialistas. Por um lado, há o argumento de que esta é uma tendência global e natural do mercado. Contudo, críticos apontam problemas de concentração que podem afetar negativamente a competitividade.
A falta de consenso sobre o tema pode vir à tona na avaliação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que precisa aprovar a compra da Wilson Sons pela MSC e da Santos Brasil pela CMA.
Favarin, da Garín Partners, ressalta que, apesar de não ser possível prever a leitura do órgão antitruste, o debate sobre a verticalização é histórico. “Pela importância do tema da verticalização para o setor, tenho dúvidas se a discussão no Cade será simples”, avalia o consultor.
Pierdomenico considera que a pauta, que deve seguir gerando discussões, precisará ser analisada com cuidado para evitar concentração de mercado. Contudo, considera que “a legislação e regulação são maduras suficientes para prevenir qualquer tipo de afronta à concorrência”.
O Estado de S.Paulo - SP 28/10/2024
Com apenas um mês de intervalo, dois dos principais operadores portuários de contêineres no Brasil foram vendidos para gigantes do transporte marítimo global. Após a compra da Santos Brasil pela francesa CMA CGM, anunciada no final de setembro, a Wilson Sons anunciou acordo com a suíça MSC, no início desta semana. Além da tendência de verticalização do setor, a falta de capacidade portuária, que eleva os preços para as empresas de transporte marítimo no Brasil, estão por trás desta tendência, segundo especialistas.
No caso da Wilson Sons, a proposta da SAS Shipping Agencies Services Sàrl, subsidiária da MSC, é de compra de 56,47% do capital da companhia, por R$ 4,3 bilhões. No final do mês passado, a CMA CGM comprou a fatia de 48% do Opportunity na maior operadora portuária de contêiner do porto santista, a Santos Brasil, por R$ 6,3 bilhões.
Os dois ativos estavam no mercado há algum tempo, com diferentes compradores no radar. Julio Favarin, sócio fundador da Garín Partners, assessoria financeira especializada em Infraestrutura, atribui o fato das duas operações terem saído do papel a dois principais fatores.
O primeiro deles é o preço dos fretes marítimos terem disparado desde a pandemia, o que gerou mais caixa para armadores e permitiu intensificar aquisições, com destaque para ativos de operação portuária.
Do ponto de vista local, o especialista destaca a pouca oferta de espaço portuário que, apesar de ser um problema global, tem se mostrado ainda mais crítico no Brasil. Para ilustrar, Favarin cita que o Porto de Santos, o principal do País e da América do Sul, já tem operado acima da capacidade, o que leva mais movimentação para outros terminais, incluindo os da Wilson Sons na Bahia e no Rio Grande do Sul.
A demanda maior do que a oferta gera também um aumento significativo nos preços pagos pelos armadores, empresas responsáveis pelo transporte marítimo, aos operadores responsáveis pela administração dos portos. Sem a perspectiva de uma melhora nesta dinâmica no curto prazo, a compra das operações portuárias fica mais atrativa para os armadores.
“A percepção de custos para os próximos anos justifica uma aquisição. Se o transportador precisa pagar muito mais para atuar em um terminal operado por terceiros, faz mais sentido ter um ativo próprio sobre o qual ele tenha mais gerência e possa garantir capacidade”, afirma Favarin.
Otimização
Os altos níveis de utilização interferem também na previsibilidade das operações, complementa o diretor-gerente da consultoria Solve Shipping Intelligence, Leandro Barreto. “É natural que os armadores queiram avançar sobre esse elo da cadeia que tem sido o calcanhar de Aquiles deles. É um movimento de defesa contra a falta de capacidade”, diz.
O consultor também vê benefícios setoriais vindos da operação. “Quando os armadores fazem esse tipo de aquisição, vêm com uma postura bastante importante de investimentos e expansão de capacidade, que é tudo que o Brasil está precisando”, acrescenta.
Fabrizio Pierdomenico, consultor e ex-secretário nacional de Portos, ressalta que, com a compra de terminais portuários, as empresas de navegação conseguem potencializar o resultado nas duas pontas, tanto do navio como da operação do terminal. “Em tese, esta verticalização traz escala, o que, baixa custos e aumenta a competitividade do terminal”, avalia.
Há quase 190 anos no mercado, a Wilson Sons atende mais de 5 mil clientes, incluindo armadores, importadores e exportadores, indústria de energia offshore, projetos de energia renovável, setor do agronegócio, segundo a companhia. O portfólio inclui terminais de contêineres na Bahia e no Rio Grande do Sul, 80 rebocadores, 23 embarcações de apoio offshore com bandeira brasileira, duas bases de apoio offshore na Baía de Guanabara (RJ), um centro logístico alfandegado em Santo André (SP) e dois estaleiros no Guarujá - SP.
A Santos Brasil opera hoje um dos maiores terminais de contêineres da América Latina, o Tecon Santos. Também em terminais em Vila do Conde, no Pará, e Imbituba, em Santa Catarina. No ano passado, a empresa faturou cerca de R$ 2,1 bilhões, um crescimento de 10% em relação a 2022.
Verticalização e Cade
O processo de verticalização, que consiste na mesma empresa atuando como armadora e operadora portuária, é alvo de controvérsias entre especialistas. Por um lado, há o argumento de que esta é uma tendência global e natural do mercado. Contudo, críticos apontam problemas de concentração que podem afetar negativamente a competitividade.
A falta de consenso sobre o tema pode vir à tona na avaliação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que precisa aprovar a compra da Wilson Sons pela MSC e da Santos Brasil pela CMA. As duas empresas já têm participações no setor portuário brasileiro. No caso da MSC, a companhia é sócia indireta de outro terminal de contêineres no Porto de Santos, a BTP.
Favarin, da Garín Partners, ressalta que, apesar de não ser possível prever a leitura do órgão antitruste, o debate sobre a verticalização é histórico. “Pela importância do tema da verticalização para o setor, tenho dúvidas se a discussão no Cade será simples”, avalia o consultor.
Pierdomenico considera que a pauta, que deve seguir gerando discussões, precisará ser analisada com cuidado para evitar concentração de mercado. Contudo, considera que “a legislação e regulação são maduras suficientes para prevenir qualquer tipo de afronta à concorrência”.
Exame - SP 28/10/2024
O governo federal tem planos ambiciosos para a concessão de portos nos próximos dois anos, que incluem os maiores leilões de terminais portuários públicos já feitos, com lotes em Santos (SP) e Itaguaí (RJ), que vão superar R$ 3 bilhões em investimentos cada um.
O pacote reúne 58 leilões até 2026, cujos projetos totalizam R$ 14,5 bilhões em investimentos — veja a lista completa ao final da reportagem. "Já fizemos 15 e faltam 43. Fizemos um bloco em janeiro de 2023, outro em agosto de 2024 e faremos outro em dezembro de 2024. É o maior pacote de arrendamento da história do setor portuário do Brasil", diz Alex Ávila, secretário nacional de Portos, em entrevista à EXAME.
O próximo deles será em 18 de dezembro. Serão oferecidos contratos em três portos: Santana, no Amapá, Maceió, em Alagoas, e Itaguaí, no Rio de Janeiro. Este último é o segundo maior projeto do pacote, com investimento previsto de 3,5 bilhões de reais.
Ávila aponta que o certame de Itaguaí será o maior já feito no país envolvendo um porto público, por causa do investimento de R$ 3,5 bilhões. "Isso permitirá aumentar a competitividade do porto e a capacidade de movimentação, especialmente de minérios de ferro", diz.
Novo terminal em Santos
No calendário de leilões de 2025, o destaque será um novo terminal em Santos, que deverá ampliar a capacidade de receber contêineres em 50%.
"Atualmente, o porto de Santos está movimentando algo em torno de 4,5 milhões de contêineres por ano. A capacidade de atual de Santos, com os terminais em operação, é de 6 milhões de contêineres por ano. Com o terminal novo, vamos ampliar para 9 milhões. A gente espera melhorar não só a capacidade, mas elevar o nível de serviço", diz Ávila.
O governo planeja fazer o leilão do terminal 10 de Santos no segundo trimestre de 2025. O processo começou a ser estudado em 2019 e teve audiências públicas em 2022.
"Rebatizamos ele de TCom Santos 10. Estamos fazendo a atualização dos estudos técnicos e fizemos ajustes. Inicialmente a área teria três áreas docas de atracação. Ajustamos para quatro. Com isso, a capacidade de movimentação sobe de 2,2 milhões para 2,8 milhões de contêineres por ano", diz Ávila.
Além disso, este novo terminal deverá ter um pátio logístico, para facilitar a chegada e o escoamento de mercadorias e reduzir o trânsito de veículos. Com a ampliação, o valor do projeto deve subir. "O investimento está previsto em 3,5 bilhões, mas ele deve ser corrigido, tanto pela defasagem de tempo quanto pela ampliação. A minha leitura é que facilmente esse valor passará de 4 bilhões de reais", afirma o secretário nacional de Portos.
Concessão de canais
Os planos do governo incluem, ainda, a concessão do canal do Porto de Santos, e de outros portos. "Hoje os nossos canais são todos geridos pelos próprios portos. O canal é o ativo mais importante do porto, porque sem acesso a carga não chega e nem sai", diz.
O projeto piloto da concessão de um canal será o do Porto de Paranaguá, no Paraná. "Devemos receber a versão finalizada dos estudos até 30 de outubro e no dia seguinte mandamos o documento ao TCU para avaliação. Devemos fazer, no primeiro semestre do ano que vem, este que será o primeiro leilão da concessão de um canal de porto público", diz Ávila. "Depois dele, não vamos parar."
Além desses, há estudos para concessão dos canais dos portos de Itajaí, e também nos estados da Bahia e do Rio Grande do Sul.
Com isso, as operações de dragagem, retirada de pedras, sinalização e operação de tráfego nos canais, entre outras atividades, ficariam a cargo de outra empresa. Atualmente, esse trabalho muitas vezes é feito por companhias de docas estaduais ou com contratos de duração mais curta. O Ministério de Portos e Aeroportos avalia que o modelo de concessão dos canais tornaria mais fácil a operação dos portos para as concessionárias, o que pode atrair mais interessados.
Arco norte
O governo planeja ainda ampliar o escoamento de produtos, especialmente do setor agrícola, pelos portos do Norte e Nordeste do país. "Temos hoje 25% da nossa safra sendo escoada pelos portos do Arco Norte. Até o final desta década, não tenho dúvida que vamos bater 50%. O milho, por exemplo, já tem 61% do escoamento pelos portos do Norte e Nordeste", diz o secretário.
Até 2026, estão previstos 16 leilões de terminais nessas regiões, voltados a cargas diversas, como carne, minérios e granel líquido. "No porto de Aratu, na Bahia, por exemplo, tem mais de 50% da área útil disponível para novos empreendimentos", afirma o secretário.
Uma das vantagens dos portos do Arco Norte é a maior proximidade dos Estados Unidos e da Europa. Uma viagem da Bahia a Portugal leva de 8 a 10 dias de navegação. Saindo do Sul do Brasil, são de 15 a 20 dias.
Ávila aponta que os leilões de portos já feitos tiveram boa participação de interessados e que o país vive momento favorável para negócios no setor. "Nos últimos 60 dias, tivemos 20 bilhões de reais em operações de grandes multinacionais adquirindo terminais privados dentro do nosso país", diz.
Veja abaixo a lista de leilões previstos:
Leilão em 18 de dezembro de 2024
Santana/AP - MCP03 - R$ 88,9 milhões
Maceió/AL - MAC16 - R$ 6,2 milhões
Itaguaí/RJ - ITG02 - R$ 3,580 bilhões
1º trimestre de 2025
- Vila do Conde/PA - VDC29 - R$ 716 milhões
- Santana/AP - MCP01 - R$ 84,6 milhões
- Rio de Janeiro/RJ - RDJ10 - R$ 32,6 milhões
- Rio de Janeiro/RJ - RDJ11 - R$ 5,9 milhões
- Paranaguá/PR - PAR14 - R$ 499 milhões
- Paranaguá/PR - PAR15 - R$ 293,2 milhões
2º trimestre de 2025
- Fortaleza/CE - MUC04 - R$ 360,7 milhões
- Santos/SP - STS10 - R$ 3,507 bilhões
- Santos/SP - STS33 - R$ 491,5 milhões
- Paranaguá/PR - PAR25 - R$ 564,1 milhões
3º trimestre de 2025
- Porto Alegre/RS - POA26 - R$ 21,1 milhões
- Rio de Janeiro/RJ - RDJ07 - R$ 101,7 milhões
- Recife/PE - REC11 - R$ 4,6 milhões
- Recife/PE - REC07 - ainda não há valor de investimento previsto
4º trimestre de 2025
- São Sebastião/SP - SSB01 - R$ 656,1 milhões
- Paranaguá/PR - NAT01 - R$ 23,4 milhões
- Maceió/AL - TMP - R$ 2 milhões
- Recife/PE - TMP - R$ 2,3 milhões
- Itaqui/MA - IQI16 - R$ 63,9 milhões
- Vila do Conde/PA - VDC10 - R$ 1.131,4 milhões
1º trimestre de 2026
- Suape/PE - SUA01 - R$ 4 milhões
- São Francisco do Sul/SC - SFS201 - R$ 37,4 milhões
- Itaqui/MA - IQI15 - R$ 1.567,2 milhões
- Rio de Janeiro/RJ - RDJ06A - R$ 67,8 milhões
- Recife/PE - REC13 - R$ 5,7 milhões
2º trimestre de 2026
- Imbituba/SC - IMB06 - R$ 92,7 milhões
- Imbituba/SC - IMB11 - R$ 181,7 milhões
- Salvador/BA - SSD04 - R$ 39,9 milhões
3º trimestre de 2026
- Fortaleza/CE - MUC03 - R$ 92,6 milhões
- Fortaleza/CE - MUC05 - ainda não há valor de investimento previsto
- Rio Grande/RS - RIG25 - R$ 13,1 milhões
- Rio Grande/RS - RIG40 - R$ 53,3 milhões
- Itaguaí/RJ - ITG03 - R$ 186,6 milhões
- Recife/PE - REC03 - ainda não há valor de investimento previsto
4º trimestre de 2026
- Vila do Conde/PA - VDC04 - R$ 13 milhões
TN Petróleo - RJ 28/10/2024
O navio-plataforma Almirante Tamandaré chegou ao Brasil. A unidade será instalada no Campo de Búzios, no pré-sal da Bacia de Santos, na costa do Rio de Janeiro. Plataforma do tipo FPSO (unidade flutuante de produção, armazenamento e transferência, da sigla em inglês), Almirante Tamandaré é a primeira unidade de alta capacidade a ser instalada no campo, com potencial para produzir até 225 mil barris de óleo (bpd) e processar 12 milhões de metros cúbicos de gás por dia. O FPSO saiu do estaleiro CMHI na China, no dia 31 de julho, rumo ao Brasil e vai se somar às outras cinco plataformas em operação no campo: FPSOs P-74, P-75, P-76, P-77 e Almirante Barroso.
O FPSO Almirante Tamandaré possui tecnologias para a descarbonização como, por exemplo, o flare fechado, que em conjunto com outros equipamentos, reduz a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera. Há também tecnologias para aproveitamento de calor, que reduzem a demanda de energia adicional para a unidade.
Campo de Búzios
Localizado a 180 km da costa, o campo de Búzios começou a operar em 2018 e coleciona resultados positivos, sendo o maior campo do mundo em águas ultraprofundas. O campo sozinho já responde por mais de 20% da produção total da Petrobras.
O consórcio de Búzios, atuante no campo, é composto por Petrobras (operadora), as empresas parceiras chinesas CNOOC, CNODC e a PPSA, empresa gestora dos contratos de partilha da produção.
Portos e Navios - SP 28/10/2024
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, sancionou, na última quarta-feira (23), o projeto de lei 655/2024, autorizando a parceria público-privada (PPP) para a construção, operação e manutenção do túnel imerso Santos-Guarujá, aprovado pela Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) no último dia 9 de outubro. A obra é uma demanda dos moradores da Baixada Santista e tem como objetivo alavancar a economia e melhorar a mobilidade na região, ligando Santos e Guarujá em menos de cinco minutos.
O projeto, estimado em R$ 6 bilhões, será financiado por três frentes: o governo de São Paulo, a União e o setor privado. Cerca de 86% do valor virão de investimentos públicos, divididos igualmente entre os governos estadual e federal. A estrutura de 1,5 km, dos quais 870 metros serão submersos, comportará carros, ônibus, caminhões e incluirá uma ciclofaixa e espaço para pedestres. Além de melhorar a mobilidade, a obra deve gerar 9 mil empregos diretos e indiretos durante sua construção. Atualmente, mais de 21 mil veículos, 7,7 mil ciclistas e 7,6 mil pedestres dependem de balsas e barcos para fazer a travessia entre as cidades. Com o novo túnel, espera-se uma redução significativa no tempo de deslocamento e um impacto positivo na qualidade de vida dos moradores e turistas.
Na próxima segunda-feira (28), a Secretaria de Parcerias em Investimentos (SPI) apresentará uma proposta de traçado do túnel aos moradores do bairro Macuco, em Santos. Em dezembro, o governo do estado deve enviar a documentação atualizada ao Tribunal de Contas da União (TCU) e aguarda a aprovação do EIA-Rima para obter a licença ambiental. A previsão é que o edital da PPP seja publicado no segundo trimestre de 2025, com o leilão no segundo semestre do mesmo ano.